Não tenho muita intimidade com a literatura
infantojuvenil. Fui – muito tempo atrás – leitor da coleção Terra-Mar-e-Ar (Emílio Salgari, Júlio Verne, Robert Louis Stevenson, etc.). Depois, em algum
momento do ensino médio, li os contos e crônicas publicados em Para Gostar de
Ler. E parei por ai. Isso significa que os livros da coleção Vagalume (que
iluminaram uma geração depois da minha) não fizeram (não fazem) parte da minha
biblioteca afetiva. Provavelmente perdi algo que jamais recuperarei.
Ao longo da vida presenteei os filhos de
amigos com livros (Ziraldo, Rute Rocha e Pedro Bandeira, entre outros). Mas
(tentando não ofender os escritores), preciso dizer que nenhum desses livros
chamou a minha atenção. Tendo como objeto de estudo a literatura adulta,
ignorei todas as outras literaturas. A exceção aconteceu com a belíssima edição
de 4 Contos, do e. e. cummings – cuja compra (preciso confessar!) ocorreu mais
pela admiração que tenho pelo estadunidense do que pelo conteúdo do livro. De
qualquer forma, cumpre declarar que as histórias que ele escreveu para a filha
e para o neto são geniais e estão valorizadas pelas ilustrações de Eloar
Guazzelli.
A menos de um mês ouvi alguns
burburinhos em torno de um livro com título quilométrico: O Dia em que a Minha
Vida Mudou por Causa de um Chocolate Comprado nas Ilhas Maldivas, escrito pela
Keka Reis (ilustrações de Vin Vogel). Sou um curioso. E isso significa que fiz o
que foi necessário para conseguir um exemplar.
Gostei. Gostei muito. É um livro engraçado
– pelo menos para mim, que já ultrapassei a barreira do meio século faz um
tempão. Além disso, é uma celebração do poder da linguagem – que desliza pelas
páginas do livro com uma leveza que encanta.
As aventuras de Mia (a narradora) não
diferem das aventuras de outras meninas pré-adolescentes. Mas se todas as
histórias se parecem, o diferencial está na forma com que elas são transmitidas
ao leitor. E, nesse departamento, Mia consegue cativar. As suas
angústias são repassadas de uma maneira especial – e estão bem próximas do
mundo “real”.
Tudo começa quando Mia recebe um bilhete
do Bereba durante a aula de ciências. O que parecia certeza desmorona. O melhor
amigo (amigo com O maiúsculo) contribui para que ela tenha uma revelação
crucial: a transição entre uma e outra fase da vida não ocorre de maneira
pacifica. Mas quem está preparado para essa tempestade? Mia não está. Definitivamente,
não está. Então, no momento em que, como mágica, Bereba se transforma em Paulo,
muitas lágrimas rolam pela sua face – o banheiro é sempre um bom esconderijo
nesses momentos.
Além dessa tragédia pessoal, há o mundo
social. Por exemplo, Jade é um capítulo à parte. O mesmo vale para
a Julia F. (não confundir com a Júlia P. e a Júlia A.), que surge em cena para
atrapalhar aquilo que até cinco minutos antes do bilhete parecia não ter a
mínima importância.
O Dia em que a Minha Vida Mudou parece
espelhar um drama. É apenas aparência. Por trás de toda confusão há um pouco de
exagero. Ou melhor, um pouco de comédia. É isso que nos faz projetar o que vai acontecer
com Mia nos próximos livros.
P.S: É um palpite. Apenas um palpite. Tenho comigo que Mia vai protagonizar outros livros.
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