Praticamente desconhecido no Brasil, Kingsley William Amis (1922−1995) foi um dos grandes prosadores ingleses surgidos depois da II Guerra Mundial. Ao lado de John Osborne, Philip Larkin, John Wain, Harold Pinter, John Braine, William Cooper, Colin Wilson, entre outros, fez parte de um grupo conhecido como Angry Young Men.
Os Jovens Zangados (Irritados, Revoltados) eram contemporâneos por idade, não por identidade ideológica ou estética − embora criticassem comportamentos e grupos econômicos. Intelectuais, quase todos oriundos da classe trabalhadora ou da baixa classe média, se espalharam pela poesia, prosa, teatro e filosofia. Expressavam, com bastante veemência, desprezo e frustração com a ordem sociopolítica do Reino Unido − que não aproveitou as reformas pós−guerra para banir algumas formas de exclusão social e econômica. Do ponto de vista artístico, os Angry Young Men eram conservadores - evitavam qualquer experimentalismo radical.
Embora recebido o Booker Prize por The Old Devils, de 1986, quase todos os romances de Kingsley Amis desapareceram na poeira do tempo, exceto, talvez, Lucky Jim, publicado em 1954 − que trouxe fama (Somerset Maugham Award) e algum dinheiro ao autor. Ao todo, Amis escreveu duas dúzias de romances, vários livros de poesias, contos e crítica literária, três livros sobre bebidas e um volume de memórias. Casou duas vezes e teve três filhos. Foi sagrado Cavalheiro pela Rainha Elizabeth II em 1990, mas a sua vida costuma ser diminuída por dois acidentes literários: foi grande amigo do talentoso poeta Philip Larkin e, não menos importante, pai do romancista Martin Amis.
Martin Amis, quando jovem, ao lado do pai, Kingsley Amis |
Garnet Bowen, escritor inglês que sobrevive fazendo free lancer jornalístico, aceita escrever uma reportagem para uma publicação estadunidense. Seu amigo, Bennie Hyman, que trabalha em uma grande editora, ao saber que o amigo vai viajar para o continente, o convence a mudar a rota e ir até Portugal, onde, com despesas pagas, deve tentar desvendar um pequeno mistério literário. Ou seja, confirmar o autor de um manuscrito que a editora recebeu. Como se trata de um texto "menor", há a suspeita de não ter sido escrito por um famoso escritor − o maior talento indiscutivelmente surgido desde a morte de Conrad.
Em princípio, deveria ser uma tarefa fácil. Alguns pequenos obstáculos impedem o sucesso. Garnet Bowen viaja com a família (três filhos e a esposa) e o carro. Defensor da tese de que os filhos devem crescer sem qualquer tipo de auxilio do pai, a natureza provavelmente suprindo todas as lacunas (psicológicas, sociais e educacional), sonha com a tranqüilidade e a felicidade. Obviamente, as crianças aniquilam com qualquer possibilidade disso acontecer.
Contrastando as qualidades da Inglaterra com os defeitos que vê nos países estrangeiros, inclusive a forma engraçada com que falam a língua inglesa, o narrador do romance descreve um Portugal de caricatura. Para os brasileiros (que falam e escrevem uma variação muito particular da língua portuguesa), a reunião do pedantismo dos ingleses com as idiossincrasias lusitanas resulta em boas risadas.
Somente quando consegue se livrar da esposa, dos filhos e do carro, é que Garnet (que detesta ser chamado de Garret) consegue se concentrar em resolver o enigma que o levou para aquela parte da Europa. Embora ocorram vários episódios ridículos nesse intervalo, consegue concretizar a tarefa. E voltar a Inglaterra – único lugar no mundo onde se sente bem.
Martin Amis, não muito jovem, ao lado do pai, Kingsley Amis |
Kingsley Amis, em razão da postura anti−estabilishment dos primeiros romances, foi considerado esquerdista. Em 1957, declarou lealdade ao Partido Trabalhista. No entanto, dez anos depois, no ensaio Why Lucky Jim Turned Right (Porque Jim, o sortudo, virou à direita), anunciou uma surpreendente guinada para a direita. Desse momento em diante adotou uma postura conservadora em relação aos diversos assuntos políticos da época: a guerra do Vietnam, armas nucleares, expansão do ensino, direitos das mulheres.
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