“O que tem nesse caderno, meu
pai?”, Sami observa que ele o segura com força.
“Contas, meu filho. Contas a
pagar.”
(A Imensidão Íntima dos Carneiros,
Marcelo Maluf)
A influência árabe na literatura
brasileira ainda não recebeu o reconhecimento que lhe cabe por direito.
Os livros escritos por Raduan Nassar, Milton Hatoum, Salim Miguel, Alberto Mussa, George Bourdoukan e Whisner Fraga, entre outros, seduzem o leitor, seja revivendo os mitos que acompanham seus antepassados, seja contrastando o modo de vida presente com a recuperação do passado. São narrativas em que a união da linguagem poética com as variedades tonais da prosa produz momentos encantatórios de inigualável beleza. Simultaneamente, enriquecem a literatura brasileira.
Os livros escritos por Raduan Nassar, Milton Hatoum, Salim Miguel, Alberto Mussa, George Bourdoukan e Whisner Fraga, entre outros, seduzem o leitor, seja revivendo os mitos que acompanham seus antepassados, seja contrastando o modo de vida presente com a recuperação do passado. São narrativas em que a união da linguagem poética com as variedades tonais da prosa produz momentos encantatórios de inigualável beleza. Simultaneamente, enriquecem a literatura brasileira.
O romance A Imensidão Íntima dos Carneiros, de Marcelo Maluf, amplia esse horizonte – investigando, de forma muito particular, alguns dos conflitos que orbitam em torno do núcleo familiar. Com a intensidade de uma faca afiada – que corta um pedaço de carne, da própria carne –, o narrador (que se chama Marcelo), através da tessitura dramática, vai construindo, lentamente, uma ponte para que o passado possa atravessar a escuridão em que se encontra, e – ao mostrar os segredos que esconde – libertar as novas gerações da carga ancestral. O esclarecimento surge como resultado do embate entre a lucidez e a dor.
Assaad Simão Maluf, filho do libanês
Simão, fornece o fio condutor para iluminar a história familiar. Seus
escritos, recuperados (ficcionalmente) pelo neto, organizam uma narrativa
traumática, repleta de episódios tristes, e que não está ligada à economia da expressão
pública dos sentimentos. O exílio geográfico e afetivo, em terras brasileiras, mais
especificamente em Santa Bárbara D’Oeste, interior do estado de São Paulo, constitui
motivo suficiente para que o passado jamais seja esquecido. Independente da
quantidade de vezes que Assaad reveja mentalmente os acontecimentos que o
afastaram do Líbano, uma imagem jamais sairá de sua mente: os irmãos, Adib e
Rafiq, sendo enforcados pelos soldados turcos. Na mesma moldura, ao lado do
pai, da mãe e dos irmãos, os versos finais de um poema escrito por Adib ecoam
com a crueldade de um anátema: Dançam de mãos dadas / a minha covardia e a
minha coragem.
Marcelo Maluf |
Diante da imagem primordial (Assaad
sentado à janela, escrevendo), está a essência do relato proposto pelo neto,
pois O tempo de calar a dor ficou para trás.
Marcelo, filho de Michel, neto de
Assaad, mais do que o narrador das complicações familiares, quer entender a
história que o une aos homens de quem descende. Sabe que, quando isso
acontecer, poderá se situar no mundo – e descansar. A Imensidão Íntima dos Carneiros, fruto
saboroso da união entre a imaginação literária, o afeto e a poesia, é a comprovação cabal
desse propósito.
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