Parte do mundo literário ficou surpreso
com o anúncio que a Real Academia Sueca concedeu o Prêmio Nobel de Literatura
2017 para o mais britânico dos escritores japoneses, Kazuo Ishiguro. Entre os
especialistas (em literatura, em bolsas de apostas), ele não era considerado
como um candidato com chances reais de receber o título e, consequentemente, o
dinheiro (cerca de R$ 3,5 milhões – que equivalem aos nove milhões de coroas
suecas).
A família de Kazuo Ishiguro mudou-se
para Inglaterra quando ele tinha cinco anos de idade. Por diversos motivos foram
adiando a volta ao Japão e, por fim, adotaram a cidadania britânica. Ishiguro foi
aluno das universidades de Kent e East Anglia (onde estudou “escrita criativa”,
no curso ministrado por Malcolm Bradbury). A carreira literária iniciou com Uma
Pálida Visão dos Montes, em 1982. Quatro anos depois, publicou Um Artista do
Mundo Flutuante (vencedor do Whitbread Book of the Year, de 1986). Alcançou o
sucesso com Vestígios do Dia, ganhador do Booker Prize, de 1989. A história de
um mordomo que abdica da vida pessoal para poder servir melhor ao patrão e que,
em dado momento, precisa conviver com mudanças sociais e econômicas que ele não
entende ganhou adaptação cinematográfica (The Remains of the Day. Dir. James
Ivory, 1993). O filme concorreu a oito Oscar, mas não recebeu nenhum.
Nos anos
seguintes, Ishiguro publicou O Inconsolável (1995), Quando Éramos Órfãos
(2000), Não Me Abandone Jamais (2005), Noturnos (2009) e O Gigante
Enterrado (2015). Todos foram recebidos com algumas reservas. A guinada na direção da
ficção científica em Não Me Abandone Jamais, que tem toques de “déjà vu”,
pois trata de um mundo distópico onde as crianças e adolescentes são utilizados
para abastecer o mercado de transplantes de órgãos, causou perplexidade no
mundo literário inglês. A versão cinematográfica também não obteve grande
sucesso (Never Let Me Go. Dir. Mark Romanek, 2010).
O último livro publicado
até o momento, O Gigante Enterrado, uma fantasia medieval, onde dragões se
misturam com névoas do esquecimento e cavaleiros que serviram ao rei Arthur, seguiu
o mesmo caminho, com resenhas bastante agressivas em virtude do tom ameno utilizado
para narrar alguns momentos da identidade britânica. Para alguns críticos, o
edulcoramento infantojuvenil do livro desconsidera as lutas entre anglos e
saxões e a consequente violência que as caracterizou.
Evidentemente, todas essas observações
se baseiam em critérios de análise literária. Para o público, muitas são
irrelevantes – o leitor se satisfaz com uma trama envolvente. E poucos se
interessam em discutir o estilo seco, exato, narrativamente distante que
caracteriza a prosa de Kazuo Ishiguro. Simultaneamente, ninguém consegue negar a
sua habilidade na carpintaria literária – e que está expressa na forma com que
construiu contos e romances. Talvez seja essa a motivação que ele encontrou para
abandonar o realismo tradicional e enveredar por outros gêneros narrativos
(ficção científica, fantasia histórica). Enfim, Ishiguro mostra que não está
preocupado em ser rotulado como um escritor de estilo definitivo. Ao contrário,
quer explorar alternativas e, de certa forma, se divertir.
muito bom. ainda não li esse cara.
ResponderExcluir