Durante 18 anos, Hannah (nascida
Johanna) Arendt (1906-1975) foi uma apátrida. Entre 1933 e 1951 viveu no exílio
– e essa experiência de superar a dor mutiladora da separação (na definição
preci[o]sa de Edward Said) marcou de forma decisiva o seu pensamento político.
Celso Lafer entende que Na inexistência da tutela jurídica organizada, são os
acidentes de simpatia, a força da amizade ou a graça do amor os únicos
elementos que oferecem a um refugiado a base precária que confirma a sua
dignidade humana.
A ruptura dos laços afetivos é um dos
temas centrais de Hannah Arendt, ideias que chocaram o mundo (Hannah Arendt - Die bleierne Zeit. Dir. Margarethe
Von Trotta, 2012) – uma radiografia do debate intelectual que acompanhou o
livro Eichmann em Jerusalém – um relato sobre a banalidade do mal. Outro
tema, a intolerância (intelectual, religiosa, contra a alteridade), complementa
a discussão.
Em 1960, Adolf Otto Eichmann (1906-1962), que
estava escondido na Argentina, foi raptado pelo serviço secreto israelense (Mossad).
Em abril de 1961, um tribunal foi instaurado em Jerusalém. Hannah Arendt (interpretada
por Barbara Sukowa) se propôs a escrever alguma coisa sobre esse julgamento. Em
Israel viu uma pessoa assustadoramente normal ser acusada de alguns dos mais
horríveis crimes praticados contra a humanidade. O “monstro” nazista não
passava de um ridículo burocrata, alguém que seguia ordens sem discutir, que
não se desviava da norma estabelecida por seus superiores hierárquicos. Sequer
sabia distinguir entre o bem e o mal.
Depois de estudar minunciosamente as
transcrições dos depoimentos, Hannah Arendt escreveu uma das peças mais
impressionantes da ciência política contemporânea. Publicado em cinco partes na
revista The New Yorker, o texto somente adquiriu o formato de livro vários
meses depois.
Infelizmente, o pensamento independente
e corajoso de Hannah Arendt foi rechaçado imediatamente por parte da comunidade
judaica. Nas palavras de Gershon Scholen, ela não tinha Ahabath Israel (amor pelo povo judeu). Nesses termos,
a tese fundamental do livro (e espelhada no filme), o mal como uma característica inata de qualquer
ser humano, desapareceu no turbilhão gerado pelo conflito ideológico. O segundo
marido de Hannah, Heinrich Blűcher (Axel Milberg), definiu a questão de maneira
abrupta: Esse julgamento têm mais a ver com a História em si do que os atos de
um homem. Ou seja, as feridas provocadas pelo holocausto eram muito recentes
para permitir um distanciamento filosófico e político.
A ruptura afetiva com Hans Jonas e Kurt
Blumenfeld, importantes figuras do sionismo alemão, incomodou muito Hannah
Arendt. Mais uma vez, ela percebeu que o sentimento de isolamento (tão comum na
vida daqueles que em algum momento de suas vidas precisaram abandonar o país em
que nasceram) estava se ampliando. A solidão se torna a sua companhia mais
assídua. Poucas pessoas possuem forças para suportar a perda de amigos
próximos.
Embora discordando de algumas posições
de Hannah, Heinrich sempre a apoiou. Mas, não é possível ignorar um pequeno
diálogo entre eles, quase ao final do filme:
–Hannah!
– Sim!
– Vão enforcar Eichmann!
– Fazem bem!
– Fazem bem, mas não é justo!
– Acha que a punição não é suficiente?
– A punição é uma justiça aparente.
– Não há punição que baste para os atos dele.
– Por isso seria mais corajoso deixa-lo viver!
Essa discussão apenas reafirma outra frase,
que foi proferida em uma conversa entre Hannah Arendt e sua grande amiga, a
escritora Mary McCarthy (Janet McTeer), Há coisas que são mais fortes do que
um único ser humano.
Independente de julgamentos pessoais ou
ideológicos, a vida e o pensamento analítico de Arendt estão aquém da representação
cinematográfica. Mesmo assim, Hannah
Arendt, ideias que chocaram o mundo é um filme inspirado.
Conhecida como a aluna favorita de
Martin Heidegger, Hanna Arendt teve um caso amoroso com o seu professor quando
tinha 17 anos. Quando percebeu que ele simpatizava com os nazistas, o rechaçou
afetiva e politicamente. O seu primeiro marido, Gűnter Stern (que mais tarde
mudou o nome para Gűnter Anders), era primo distante de Walter Benjamim. Em
Paris, Hannah conheceu Bertolt Brecht, Raymond Aron, Alexandre Kojève e
Alexandre Koyré – pensadores que (juntos com Karl Jaspers, Walter Benjamim e
Martin Heidegger) a influenciaram bastante. Escreveu, entre outros livros, As
Origens do Totalitarismo (1951), A Condição Humana (1958), Sobre a
Revolução (1963), Homens em Tempos Sombrios (1968).
Uau, encantador. Gostei da dica ! :O
ResponderExcluirVou procurar ler suas obras, me ajudarão bastante na faculdade.
Abraços,
Stefanie O.