Novena para Pecar em Paz: nove contos
sobre mulheres. Mães, filhas, esposas, amantes, meninas. O corpo como
estratégia de resistência, de resiliência. A violência doméstica, o cerceamento
social, a opressão política, a repressão sexual, a negação das questões de gênero. Mordaças.
Novena para Pecar em Paz pronuncia –
em voz alta e clara – que não se deve fornecer poder ao opressor. Prenuncia que, apesar
da dor, dos lamentos e das lágrimas, não há porque aceitar os ideais românticos
(príncipe encantado, bela adormecida, finais felizes). Existem outras formas de
superar os obstáculos.
Novena para Pecar em Paz coloca
Brasília no centro do mapa da violência (imaginária, simbólica, física). O
mundo social reproduzindo o mundo político. As arbitrariedades se multiplicando.
A crueldade caminha ao lado dos inocentes, esperando pelo momento propício para
iniciar os rituais de destruição.
Novena para Pecar em Paz denuncia o
abuso masculino e a fragilidade feminina. Também mostra as fraquezas dos homens
e a energia das mulheres. Destino? Ninguém sabe de onde surge a força de quem
resiste aos horrores que acompanham a injustiça e o medo. Um dia, qualquer dia,
o desespero se pronuncia de forma inequívoca. Acordar é que é o pesadelo.
Cinthia Kriemler |
Novena para Pecar em Paz encena um jogo que engana, que não é (nunca foi) bacana. The art of losing, um bom título para exercício dramático. Ou então, a explicação derradeira para a estranha fruta. O amor em descompasso, rebelde aos ditames da norma, fruição do corpo em contato com outro corpo. E esse vazio que nunca deixará de existir.
Novena para Pecar em Paz conta das dificuldades de mãe solteira, criar duas filhas, evitar o mal. Quem quer namorado? Mamãe? O tempo passa, as meninas crescem, o predador à espreita. Não há glamour nas tragédias. Nossa única doença é sermos mulher. Mas não queremos cura fácil.
Novena para Pecar em Paz mostra aquele
que nasceu em corpo de homem, mas pensa e age como se mulher fosse. Entre a
divisão e a diversão, as certezas de que somente existe isso e aquilo e que
aqueloutro está fora de qualquer consideração.
A infelicidade e a intolerância. (...) minha preocupação era que a
certidão de óbito teria um nome que não sou eu.
Novena para Pecar em Paz sussurra, fala, grita sobre esse acordar com saudades de umas coisas que não têm nome. As noites intermináveis em que ninguém responde aos chamados de socorro. A vastidão do mundo restrita ao território de uma cama. Dormir, dormir.
Novena para Pecar em Paz também vai ao supermercado. A história familiar costuma cobrar caro pelo passado. Escolher essa marca e não a outra. Ultrapassar a porta da loja, divisória entre aqueles que consomem e aqueles que esmolam. Os olhos quietos em mútua compreensão. A distância entre os seres humanos se prolongando. A culpa em formato de algumas moedas.
Novena para Pecar em Paz revela muitos pecados e nenhuma oração. O desejo de fuga. Abandonar tudo. Ir embora. Sem olhar para trás. Sem remorsos. Sem desculpas. Abraçar uma nova vida. A impossibilidade. Menos cansativo é comprar sorvete para a filha. Antecipar a textura cremosa que em breve tocará minha língua e descerá pelo esôfago de um corpo que já não existe.
Novena para Pecar em Paz reflete o
desconforto. Preces e feridas, ausências e temor. Noves fora, qual é o grau de
intensidade da dor da mãe que precisa escolher a roupa com que a filha vai ser
enterrada? Haverá ritual mais triste?
Novena para Pecar em Paz: Beatriz Leal
Craveiro, Cinthia Kriemler (Org.), Lisa Alves, Lívia Milanez, Maria Amélia
Elói, Mariana Carpanezzi, Patrícia Colmenero, Paulliny Gualberto Tort e
Rosângela Vieira Rocha.
P.S: A capa é da Mariana Carpanezzi.
P.S: A capa é da Mariana Carpanezzi.
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