Nojento. Não há outra definição para
sintetizar o filme A Hora Mais Escura (Zero Dark Thirty, Dir. Kathryn
Bigelow, 2012). Por diversos motivos, não o vi quando passou no cinema. Deveria
ter permanecido na ignorância. Mas, ao ver o DVD na locadora, imaginei que se
tratava de algo interessante. Mero engano. Mera representação do fascismo
imperialista – sem conteúdo, exceto o esforço publicitário de que a luta contra
o terrorismo perdoa todos os pecados. Em síntese, lixo.
A versão cinematográfica do assassinato
de Osama Bin Laden começa com um recurso tipicamente canalha. Com a tela
escura, o espectador ouve algumas vozes desesperadas de vitimas do 11 de
setembro tentando se despedir de parentes ou suplicando por ajuda. Ou seja, determinado
o crime, urge punir o suposto criminoso. São esses poucos segundos que
estabelecem o tom ideológico do filme.
A cena seguinte complementa o esquema:
um muçulmano está sendo interrogado por agentes da Central Intelligence Agency
(CIA). Agressões físicas, amarrar as mãos do prisioneiro e pendurá-lo no teto, privação
de sono e alimentação, encarceramento em locais minúsculos – todas essas ações
educadíssimas são atos preparatórios para o "grand finale": waterboard – a
técnica de tortura favorita dos campeões da Democracia". Consiste em
simular um afogamento – a água lançada sobre a face e para dentro das vias
respiratórias daquele que está sendo “interrogado”. O propósito dessa
selvageria é destruir psicologicamente o prisioneiro. Nesses momentos, a
Convenção de Genebra e os Direitos Humanos se transformam em obras de ficção. A terra de ninguém (reverberando o horror de Abu Ghraib e Guantánamo), onde a razão
ética desapareceu, nivela o terrorismo e a civilização pelos fundamentos da barbárie.
Em outras palavras, são esses elementos de loucura que abrem um precedente para
permitir o entendimento de que todas as ações são permitidas, são legais, são
justas. Para todos os lados.
Os diálogos do filme (seja no dia-a-dia
dos personagens, seja nas salas de tortura) estão conectados com um propósito
educativo: repetir mil vezes a mensagem para que todos (personagens e
espectadores) se convençam que a diferença entre a verdade e a mentira
depende de um slogan midiático: tornar o mundo mais seguro para a Democracia (uma forma de governo submissa aos mecanismos de manipulação da informação).
Depois de expor a barbárie, o filme se
concentra na descrição de Maya, personagem interpretada por Jessica Chastain.
Ela não tem amigos, ignora os relacionamentos afetivos, não perde o foco quando
o assunto é trabalho. Como todo carrasco, não possui humor. Confunde determinação
com obsessão. E, nesse andamento, incomoda os colegas, faz pressão, não esconde
que gosta de resolver os problemas pela força. Traduzindo: um caso típico de
frustração sexual.
A soma de todos esses elementos comprova
a demência ocidental. A direita mais reacionária – destilando o medo a cada
instante – conduz os acontecimentos na direção do horror. E despeita a
soberania de países como o Afeganistão e o Paquistão – não bastasse ter
alimentado a imagem publicitária de que todos os seus habitantes são
terroristas.
A doutrina militar estadunidense shock and awe (choque e pavor) se revela instrumento de força desproporcional quando,
cinematograficamente, um grupo de extermínio invade a casa onde estão morando
os vários suspeitos. Embora a ação se mostre, em vários momentos, como exemplo de visível incompetência (desde
a falta de coerência na decisão para invadir a casa até um helicóptero que cai),
a carnificina ocorre. Em ritmo Counter Strike, o uso da força avassaladora resume
a diferença entre a vida e a morte em uma partida de videogame. Somente mulheres
e crianças são poupadas. Todos os homens são fuzilados.
A cena final mostra o ridículo
multiplicado pelo ridículo: Maya, ao descobrir que sua vida não possui mais
nenhum sentido, pois seu inimigo foi destruído, cai em choro compulsivo. Algum
cretino há de considerar que ela foi tomada de emoção e pelo alívio. Mentira.
Chora por si mesma. Incapaz de entender o que aconteceu. O fascismo se descobre
ignorante e inútil – exceto como instrumento de opressão.
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