Estranhamento constante, amparado no espelhamento grego, mostrando-se insuficiente para garantir os pés no chão. Ruas de Sidney, Austrália, outro lado do mundo, passeio conforme algum mapa turístico. O encontro entre o passado e o presente dissolvendo dias de sol e afetos.
A aventura de produzir parágrafos longos – caudalosos, vinte, trinta frases separadas por vírgulas, invadindo o espaço da página em branco até encontrarem algum ponto, obstáculo gráfico intransponível, o fluxo interrompido provisoriamente, pausa breve, momentânea, até que uma nova frase se reinstale vorazmente, impulsionando a continuação narrativa – não podem ser considerados como tarefa trivial, ao alcance de qualquer um. O ritmo acelerado que acompanha a selvageria das orações descontinuas que constituem o parágrafo impede o nexo imediato do pensamento, que, na contramão, vai se (de)formando aos poucos, várias camadas se sobrepondo, umas em cima das outras, como um depósito desorganizado. O leitor perde o fôlego diante de tamanho atordoamento. Nada que lembre as proezas feéricas propostas por José Saramago, Marcel Proust e James Joyce. Nessa planície textual, há recusa das amarras da pertença. Embora sinta prazer em devorar miragens, referências e apropriações indevidas. Antropofagia básica. Base para a reinvenção. Solução para os impasses da estrutura narrativa. Alternativa contemporânea para esse beco sem saída em que deságuam todas as histórias de amor.
Ao mesmo tempo, cabe perguntar: a forma é mais importante que o conteúdo? Provavelmente, não. O contrário também não corresponde ao que importa. A intensidade de Ithaca Road impressiona. Fenômeno raro em romance brasileiro. Poucos conseguem avançar nas duas direções. Simultaneamente. Ao mesmo tempo, assusta. A brevidade do texto, 110 páginas, impede que determinadas demandas sejam contempladas. Inquietante volatilidade que poderia ter mais substância. As lacunas que povoam o enredo lembram imagem de meteoro que desaparece no horizonte. Bonito durante cinco segundos. Nada mais do que isso. Entrou em cena para semear dúvidas, sombras, instabilidades.
A aventura de produzir parágrafos longos – caudalosos, vinte, trinta frases separadas por vírgulas, invadindo o espaço da página em branco até encontrarem algum ponto, obstáculo gráfico intransponível, o fluxo interrompido provisoriamente, pausa breve, momentânea, até que uma nova frase se reinstale vorazmente, impulsionando a continuação narrativa – não podem ser considerados como tarefa trivial, ao alcance de qualquer um. O ritmo acelerado que acompanha a selvageria das orações descontinuas que constituem o parágrafo impede o nexo imediato do pensamento, que, na contramão, vai se (de)formando aos poucos, várias camadas se sobrepondo, umas em cima das outras, como um depósito desorganizado. O leitor perde o fôlego diante de tamanho atordoamento. Nada que lembre as proezas feéricas propostas por José Saramago, Marcel Proust e James Joyce. Nessa planície textual, há recusa das amarras da pertença. Embora sinta prazer em devorar miragens, referências e apropriações indevidas. Antropofagia básica. Base para a reinvenção. Solução para os impasses da estrutura narrativa. Alternativa contemporânea para esse beco sem saída em que deságuam todas as histórias de amor.
Ao mesmo tempo, cabe perguntar: a forma é mais importante que o conteúdo? Provavelmente, não. O contrário também não corresponde ao que importa. A intensidade de Ithaca Road impressiona. Fenômeno raro em romance brasileiro. Poucos conseguem avançar nas duas direções. Simultaneamente. Ao mesmo tempo, assusta. A brevidade do texto, 110 páginas, impede que determinadas demandas sejam contempladas. Inquietante volatilidade que poderia ter mais substância. As lacunas que povoam o enredo lembram imagem de meteoro que desaparece no horizonte. Bonito durante cinco segundos. Nada mais do que isso. Entrou em cena para semear dúvidas, sombras, instabilidades.
Paulo Scott |
Mulher independente, que não conhece
barreiras geográficas, um dia em Londres, outro em Dublin, namorado austríaco,
Jörg, que está no Brasil, jornalismo investigativo, outra falcatrua
terceiro-mundista a ser denunciada, Narelle, neozelandesa, mestiça de maori com
europeu, sabe que não há futuro em esperar (vinte anos?) pela volta do irmão
desaparecido. Não tem vocação para encenar a farsa de Vladimir e Estragon. Não nasceu
para bordar colchas mortuárias – prefere comprá-las prontas em feirinhas de
bairro. Não possui estoicismo suficiente para acumular noites de castidade –
qualquer guerreiro viril ao alcance de seu corpo serve para aliviar tensões e
tesões, e pouco se importa com sentimentos descartáveis logo depois de saciar a
sede, tchau, foi bom, gostei (gozei) muito, amor é outro departamento.
Anna surge como um anjo da anunciação, a
possibilidade de subverter o previsível. Espaço para inúmeras perguntas e alguns
desenhos – vaticínios a respeito da maldição divina, oráculo que decifra a
maldade humana, desumano horror que denuncia as falhas que acompanham o
existir. Resistir, estratégia de sobrevivência, também se mostra um exercício
de teimosia.
Em um mundo que abomina o diferente, que
exclui qualquer coisa que não siga padrões de comportamento ou de bons modos, Ithaca
Road, apesar de não resolver algumas questões, se assemelha a uma ilha paradisíaca, perdida em um mar de tolices. A literatura brasileira agradece.
ESPERANDO POR PAULO SCOTT, QUE SERÁ O CABEÇA DE UM CURSO DE ESCRITA CRIATIVA NO SESC-LAGES EM AGOSTO.
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