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quinta-feira, 25 de julho de 2013

WILLIAM FAULKNER E OS DESAFIOS DO ESCRITOR

– Eu estava vivendo em New Orleans, fazendo todo tipo de serviço para ganhar algum dinheiro de vez em quando. Conheci Sherwood Anderson. Costumávamos andar pela cidade durante a tarde, conversando com as pessoas. De noite nos encontrávamos de novo e nos sentávamos diante de uma garrafa ou duas, enquanto ele falava e eu ouvia. De manhã eu nunca o via. Ele ficava fechado, trabalhando. No dia seguinte, repetíamos tudo. Concluí que, se aquela era a vida de um escritor, tornar-me escritor era o que me convinha. Comecei então a escrever meu primeiro livro. Descobri imediatamente que escrever era divertido. Já tinha me esquecido que não via o sr. Anderson havia três semanas até que ele me entrou pela porta, era a primeira vez que vinha me ver, e disse: O que está havendo? Está zangado comigo?. Eu lhe disse que estava escrevendo um livro. Meu Deus!, exclamou, e saiu. Quando terminei – era Soldier’s Pay –, encontrei a sra. Anderson na rua. Ela me perguntou como ia o livro, e eu disse que o tinha terminado. Sherwood diz que fará um trato com você. Se ele não tiver que ler o manuscrito, dirá ao seu editor para aceitá-lo, disse ela. Eu respondi: Feito, e foi assim que me tornei escritor.


– (...) o melhor emprego que já me foi oferecido foi o de zelador de um bordel. Na minha opinião, é o ambiente perfeito para um artista trabalhar. Proporciona ampla liberdade econômica. Ele se vê livre do medo e da fome; tem um teto seguro e nada para fazer, exceto cuidar de umas poucas contas e ir uma vez por mês pagar à polícia local. O lugar é quieto de manhã, que é a melhor hora do dia para se trabalhar. Há bastante vida social à noite, se ele quiser participar, para impedi-lo de se aborrecer; isso lhe dá uma certa posição em sua sociedade. Não tem nada a fazer, já que a madame controla a contabilidade. Todos os moradores da casa são mulheres, e o respeitariam e o chamariam de “doutor”. Todos os contrabandistas de bebidas da região também o chamariam de “doutor”. E ele poderia tratar os policiais pelo primeiro nome.

De modo que o único ambiente de que o artista necessita é qualquer lugar onde possa obter paz, solidão e prazer a um preço não muito alto. Tudo o que o ambiente inadequado lhe proporcionará é pressão alta; ele passará mais tempo se sentindo frustrado ou ressentido. Minha própria experiência tem me mostrado que as únicas ferramentas de que preciso para o meu ofício são papel, tabaco, comida e um pouco de uísque.



– (...) os livros que leio são aqueles que conheci e amei quando era moço e aos quais volto como se volta aos velhos amigos: o Antigo Testamento, Dickens, Conrad, Cervantes – Dom Quixote. Leio-os todos os anos, como alguns leem a Bíblia. Flaubert, Balzac – ele criou um mundo intacto próprio, uma corrente sanguínea que flui através de vinte livros –, Dostoiévski, Tolstói, Shakespeare. Leio Melville ocasionalmente, e dos poetas Marlowe, Campion, Jonson, Herrick, Donne, Keats e Shelley. Ainda leio Housman. Já li esses livros tantas vezes que nem sempre começo na primeira página ou leio até o fim. Leio apenas uma cena, ou o tocante a uma personagem, assim como você se encontra e conversa com um amigo por alguns minutos. 


– Um artista é uma criatura arrastada por demônios. Não sabe por que o escolheram e normalmente está ocupado demais para se perguntar isso. É totalmente amoral, pois irá roubar, mendigar, pedir emprestado ou furtar de quem quer que seja para ver o seu trabalho realizado. 

– Os dois grandes homens do meu tempo eram [Thomas] Mann e [James] Joyce. Deveríamos nos aproximar do Ulisses, de Joyce, como o pregador batista analfabeto se aproxima do Antigo Testamento: com fé.  

– Suponho que, enquanto as pessoas continuarem a ler romances, outras continuarão a escrevê-los, ou vice-versa; a menos, é claro, que as revistas ilustradas e as histórias em quadrinhos finalmente atrofiem a capacidade do homem de ler, e a literatura realmente estará em seu caminho de volta à escrita pictórica das cavernas de Neanderthal.

– Um escritor é alguém congenitamente incapaz de dizer a verdade. Por isso, o que ele escreve chama-se ficção.

 O sexo e a morte  a porta da frente e a porta de trás do mundo.   



P.S: Algumas dessas citações estão em uma entrevista concedida a Jean Stein Vanden Heuvel, para a Paris Review, no inicio de 1956, em New York. 

Um comentário:

  1. Ambientes virtuais pecam porque criam motivos para que voltemos, aqui hámotivos de sobra, você os cria e deixa-os à vista, totalmente..

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