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terça-feira, 5 de março de 2013

POR QUE ALMOCEI MEU PAI

Parábola (do grego “parabole”) é uma narrativa alegórica, que utiliza situações e pessoas para transmitir lições de sabedoria ou moral. Construída linearmente, com começo, meio e fim (nessa ordem), utiliza a linguagem metafórica como é possível verificar em algumas passagens da Bíblia, por exemplo. O realismo contribuiu para que se tornasse um gênero literário quase esquecido.

Por algum motivo inexplicável, o texto (que beira o nonsense) Por Que Almocei Meu Pai, do estadunidense Roy Lewis, escrito em 1960 e publicado no Brasil em 1993, saiu de catálogo. Ou de moda.  Lamentável. Poucas vezes na história da literatura um autor conseguiu desenvolver um tema tão anacrônico e, ao mesmo tempo, tão engraçado.

Centrada na pré-história, a narrativa desmonta a história da evolução humana. Contrastando piadas, chistes e situações inusitadas com o cientificismo contemporâneo, produz interessante curto-circuito linguístico. E dezenas de gargalhadas. Impossível não rir com diversos episódios. Os principais são a institucionalização das relações exogâmicas e a aquisição do fogo.

Edward, o pai, em experimento antropológico avant la lettre, elabora um complexo esquema de caça para afastar os filhos da órbita familiar. Quer garantir a sobrevivência da espécie misturando tribos. Inabilitados para as caçadas amorosas, os rapazes se tornam presas fáceis nas mãos de mulheres muito mais preparadas para os relacionamentos afetivos e sexuais. O patriarcado se mantém na aparência, mas as disputas pelo poder se resolvem na cama. Seria trágico não fosse muito divertido – e real. 

Assumindo posição similar a de Prometeu, Edward, sem suspeitar que os avanços propostos pela modernidade estão intimamente ligados a inúmeros desastres, descobre como dominar o fogo. Quer dizer, dominar mesmo ele não domina, mas, como todo curioso, vai experimentando. Embriagado pela fantasia que é controlar a natureza, ignorou quaisquer medidas de segurança.  Além dos avisos de seu irmão, Vanya, eterno pessimista.

Foi um lindo incêndio. Por pouco a horda não se transforma em churrasco. Como compensação para esse desastre ecológico, a humanidade adquiriu novos hábitos gastronômicos. A carne de mamute se tornou mais palatável depois de assada.  

Assim, entre a tentativa e o acerto, a vida coletiva vai se acertando, estabelecendo regras e comportamentos. O grupo inicial se multiplicou através dos filhos dos filhos.

A tarefa seguinte coube ao filho mais velho, que também é o narrador. Seguindo a tra(d)ição histórica e antecipando as teorias freudianas, na primeira oportunidade encontra um modo de afastar o pai de cena e assumir o poder. A farsa se renova nas páginas finais, quando o cadáver paterno alimenta o avanço da tecnologia. 

Por Que Almocei Meu Pai projeta uma lição ética imprescindível: para quem quer viver bem, não há melhor remédio que o humor. 

Um comentário:

  1. É o segundo comentário positivo que leio sobre esse livro em menos de uma semana. Como não se trata de um lançamento, acho que tenho que encarar como imposição do acaso (ou sinal do céu, benzeria-se um carola) pra que eu o leia. É o que farei. Valeu pela dica!

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