Tarado! Degenerado! Canalha! Despudorado!
Obsceno! Safado! Sem-vergonha! Boca suja! Os adjetivos, todos seguidos por
indefectível ponto de exclamação em riste, são utilizados a granel para criar
um efeito multiplicador da indignação. Alguns, como é o caso dos pouco
frequentes fescenino, ignominioso, licencioso e safardana, mostram que um bom
repertório de insultos e ofensas pode ser visualizado como um fator de instrução
cultural – para descobrir os significados basta consultar os dicionários ou acessar
o titio Google, está tudo lá, ao lado de coisas piores.
O homenageado por tantas láureas,
Reinaldo Moraes, parece não se importar com essas incontroláveis e efusivas demonstrações
de carinho. Muito pelo contrário. Gargalha na mesma proporção com que os detratores
tentam intimidá-lo. Fato comprovado pelos textos que integram O Cheirinho do
Amor, livro que reúne três dúzias de crônicas publicadas na revista Status,
entre março de 2011 e maio de 2014, e que tratam dos mais variados e malucos
desvios (e acertos) sexuais. Na cama, sofá, banco de trás do fusca, além de
outros lugares possíveis para a, digamos, acoplagem sexo-recreativa, cabem centenas de
casos, anedotas e considerações de ordem político-filosófica. Por exemplo, as contribuições ao mundo do sexo do artista
plástico Jeff Koons, ex-marido da ex-deputada italiana Ilona Staller, conhecida
mundialmente como Cicciolina. No mesmo diapasão, merece
atenção algumas sugestões sobre as comemorações que podem ser realizadas em 6
de setembro (6/9), dia do sexo. Empalamentos, promovidos entre moradores do
Vaticano e rapazes liberais, e os esforços imaginários para dar um gás no
clássico cinco-contra-um também foram incluídos no repertório. O
empreendedorismo de Tracy Elise, que fundou o Templo da Deusa, uma instituição
pornô-religiosa destinada a ensinar as delícias do sexo tântrico aos
interessados na modalidade, revela que na prática diária das mais interessantes
sacanagens não está incluído o bom comportamento – que, sem querer abusar das
metáforas, na hora do bem-bom deve ser a primeira peça de roupa a ser despida.
Em dois momentos (no mínimo) o leitor
precisa tomar folego, respirar fundo e se divertir – e muito, pois a vida,
mesmo naquelas ocasiões em que tangencia o trágico, não consegue fugir do
patético. Ao comentar as travessuras pornô-sexuais de James Hunt (1947-1993), piloto
de Fórmula Um, na crônica Histórias do Pancadão, Reinaldo, produz uma
fantástica resenha do filme Rush – No Limite da Emoção (Dir. Ron Howard, 2013), que retrata as últimas corridas do campeonato mundial de automobilismo de 1976.
Aliás, quem ainda não viu o filme, precisa correr para a locadora mais próxima
e alugar uma cópia. O outro instante de brilho está na crônica homônima ao título do livro e trata de algo incorpóreo, porém
de suma importância para quem valoriza a doce arte do fuque-fuque.
Transitando entre as épicas memórias de um tempo que nem mesmo uma dose
reforçada do comprimido azul consegue recuperar e os reflexos produzidos por um
filme clássico, Perfume de Mulher (em duas versões, lembrarão os cinéfilos: Dir. Dino Risi, 1974 e Dir. Martin Brest, 1992), Reinaldo
discorre com ares de catedrático sobre essa madelaine proustiana a-pós-a-moderna-idade
que são os odores femininos. Ciente de que não há afrodisíaco mais poderoso que
o bouquet intimo, faz uma serie de considerações de suma importância sobre fragrâncias
e sabores extraídos nos momentos de atividade sexual. Enquanto tem olfato, o
ser humano tem tesão, esclarece o mestre.
Reinaldo Moraes declara que só os tolos confundem sexo com amor e amor com sexo. E, como as suas crônicas estão focadas exclusivamente no sexo, as questiúnculas que caracterizam o amor não estão incluídas no pacote. Por isso mesmo, o autor mostra não ter pudor com os interditos impostos pelo discurso edulcorado pelo politicamente correto, aquele mesmo que foge de palavras-chaves como buceta, caralho, cu, porra, trepar, cabaço e punheta, entre outras menos votadas pelos ilustres pervertidos de plantão. Ele sustenta (nas entrelinhas) a ideia de que essas palavras – e seus sinônimos – são totalmente adequadas para a conversação diária, seja na mesa de bar, seja no convívio do lar. Errado é reprimir pensamentos ou omitir sentimentos.
O ser humano (desde o momento em que a primeira célula se reproduziu por mitose ou meiose, sei lá qual, faz tempo que fugi da escola) pode ser definido como uma espécie de abaporu (do tupi, aquele que come gente). No bom sentido, óbvio. Homens e mulheres adoram trocar fluídos, odores e gemidos nas mais variadas situações, posições e profundidades, confirmando que na vida sexual não há lugar para a apatia (do grego, apathea, ausência de paixão). Quer dizer,... broxar também faz parte – contanto que esse acidente de trabalho não se transforme em rotina!
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