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terça-feira, 9 de junho de 2015

SÉTIMO – UMA REFLEXÃO SOBRE O CINEMA

Quando se diz que o cinema argentino está anos-luz de vantagem da indústria cinematográfica do Brasil, sempre surge no horizonte empoeirado do nacionalismo algum ingênuo (ou mal-intencionado) a dizer que não é bem assim, que isso é um exagero e que, mesmo que não haja reconhecimento do público, estão sendo produzidas boas comédias nos estúdios brasileiros. Ao ler esse tipo de declaração ufanista, nada mais resta senão reconhecer que o Febeapá (Festival de Besteiras que Assola o País) continua em uso, apesar de seu criador, Stanislaw Ponte Preta (também conhecido como Sergio Porto) ter falecido em 1968.

Basta uma visita a qualquer locadora de filmes (ou à Internet) para se perceber que o Brasil foi superado pela Argentina – e faz tempo! Não bastassem os dois Oscar de Melhor Filme Estrangeiro,  La Historia Oficial (Dir. Luiz Puenzo, 1985), El Secreto de Sus Ojos (Dir. Juan Jose Campanella, 2009), ainda há belezas de diversos matizes como Nueve Reinas (Dir. Fabián Bielinsky, 2000), Plata Quemada (Dir. Marcelo Piñeyro, 2000), El Hijo de la Novia (Dir. Juan Jose Campanella, 2001), El Abrazo Partido (Dir. Daniel Burman, 2004), El Hombre de al Lado (Dir. Gaston Duprat, Mariano Cohn, 2009), Un Cuento Chino (Dir. Sebástián Borensztein, 2011), Medianeras (Dir. Gustavo Taretto, 2011), Relatos Savajes (Dir. Damian Szifrón, 2014), entre outros.

Para exemplificar essa tese, cabe uma análise superficial de Sétimo (Septimo. Dir. Patxi Amezcua, 2015), que, embora não seja um filme espetacular, consegue captar o ritmo hollywoodiano dos melhores filmes de suspense. 

Em um dia que poderia ser considerado como comum, o advogado Sebastián (Ricardo Darin) precisa comparecer a uma audiência importante no fórum de Buenos Aires. Antes, passa no edifício em que mora Délia (Belén Rueda), a ex-esposa. É o seu dia de levar os filhos, Luca e Luna, à escola.

Quando estão juntos, o pai e os filhos compartilham uma forma de diversão aparentemente inofensiva. Sebastián desce pelo elevador, as crianças fazem o trajeto pela escada. Ganha quem chegar primeiro lá embaixo. Nesse dia, eles repetem a brincadeira. Mas, o resultado é inesperado. Em algum momento, entre o sétimo andar e o térreo, as crianças desaparecem. No início, Sebastián imagina ser uma brincadeira sem graça. Depois, o desespero toma conta e, sob o efeito da paranoia, começa a suspeitar de todos – inclusive do porteiro, Miguel (Luis Ziembrowski), e de um vizinho, o policial Rosales (Osvaldo Santoro).

A atmosfera dramática, misturando angústia e mistério, se torna aguçada. A sensação é ampliada pelo uso de um ambiente fechado. Quase todas as cenas estão centralizadas dentro do edifício – entre o sétimo andar, o térreo e a garagem.

Acossado pelo telefone – que não para de tocar –, Sebastián precisa estabelecer qual é a sua prioridade. Entre o futuro profissional, ajudar a irmã que pede socorro (vítima da violência do ex-marido) e o desaparecimento dos filhos, o grau de tensão psicológica se multiplica.

Diante do pedido de resgate (cem mil dólares), urge tomar medidas extremas. A violência urbana, que havia se manifestado intramuros, se expande na direção da vida coletiva. A vida de Sebastián entra em colapso. Nada mais será como antes.

O desfecho do filme une as diversas pontas soltas e surpreende pela forma com que a racionalidade combate a crueldade humana. No último instante, tudo se torna transparente. E assustador.

Para completar o raciocínio inicial, cabe perceber que um filme parecido com Sétimo provavelmente não seria realizado no Brasil. Entre os inúmeros problemas fáceis de localizar (atores competentes, financiamento para a produção, distribuição, imaginação para criar um roteiro decente, etc.), na primeira oportunidade, o(s) roteirista(s) incluiria(m) alguma piada idiota sobre a “esperteza” carioca ou sobre a ausência de humor dos paulistas, atitude instintiva de quem não consegue conviver com a aura que identifica a tragédia. Logo depois, confirmando que o brasileiro vive em constate contradição, tudo seria resolvido com gritos, tiros e algumas vítimas de “balas perdidas”. A “idolatrada salve salve” detesta a sutileza e a elegância.

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