Costuma-se
dizer que as más ações ocorrem porque alguém está procurando por boas ações.
Não é a regra geral, mas a incidência desses desastres ocupa posições elevadas
nas estatísticas. No entanto, o mais comum é que algumas catástrofes ocorram
por maldade – pura e simples. Possivelmente foi isso o que aconteceu quando um
segmento da Secretaria de Educação do governo de Santa Catarina, no dia 07 de
novembro, decidiu que alguns livros devem ser recolhidos das bibliotecas escolares estaduais. Ou seja, ficarão fora
do alcance de parte dos alunos catarinenses.
Não
cabe discutir se os livros censurados (e este é um caso explícito de censura) são
apropriados (ou não) para os alunos. Esse é o aspecto secundário da contradição
principal – a liberdade de escolha. Ao leitor cabe a responsabilidade pelo que
ele escolhe ler. Não é tarefa estatal interferir nesse tipo de atividade. Além
disso, contraria uma das tarefas mais importantes da área educacional: garantir
que a leitura seja possível – e em todos os níveis.
Criar
um novo Index Librorum Prohibitorum nada mais é do que uma forma de gerar novos
leitores. Provavelmente esses livros estavam fora do radar de centenas de
alunos e adultos. A curiosidade move montanhas, excita e estimula na descoberta
de desejos e prazeres. Diante do buraco da fechadura, todos querem espiar (mesmo
que seja para encontrar a decepção).
Sintomaticamente,
os livros que estão sendo retirados das bibliotecas escolares tratam de temas
que oscilam entre a religião, a política, bullying escolar, os relacionamentos
afetivos e a violência juvenil. Quem se sente ameaçado por esses assuntos? Quem
quer impedir a discussão das questões abordadas nesses textos? Como ensina o
clássico Fahrenheit 451, de Ray Bradbury, os livros são perigosos e os
governos autoritários procuram combatê-los. Violentamente. Seja retirando-os do
alcance do leitor, seja destruindo-os. Exemplos históricos não faltam.
Um
fato importante na situação está na visível desatualização do ato de censura. A
leitura do livro físico possibilita melhor compreensão do enredo narrativo, mas
(quando tentam impedir essa possibilidade) sempre se pode optar por alguma alternativa.
Além do acesso aos e-books, existem as versões cinematográficas e televisivas. Sem entrar na
discussão estética sobre as formas artísticas, cabe lembrar os três exemplos
mais relevantes na lista censurada: Laranja Mecânica (Dir. Stanley Kubrick)
foi filmado em 1971, Coração Satânico (Dir. Alan Parker) em 1987 e It – a coisa (Dir. Andy Muschetti) em 2017. Complementando, a Netfix está exibindo uma série baseada em Os Treze Porquês. Qualquer um que consiga acesso aos canais de streaming pode ver essas adaptações. E isso significa, de maneira simplificada, o quanto é inócuo o
esforço de quem quer impedir o fluxo de informações. A modernidade tecnológica
rompeu (para o bem e para o mal) com todas as barreiras moralistas.
Mário
Quintana escreveu que Livros não mudam o mundo. Quem muda o mundo são as
pessoas. Os livros só mudam as pessoas. De certa forma isso ecoa a frase de
Oscar Wilde: Os livros não se dividem entre morais e imorais: são bem escritos
ou mal escritos, e isso é tudo. Então, para que possamos contribuir para um
mundo melhor (sem abdicar do senso crítico) precisamos de mais leitores e de muitos
livros. Quanto mais, melhor!
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