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terça-feira, 27 de novembro de 2012

BEL AMI, O FILME, E ALGUMAS QUESTÕES MENORES DA POLÍTICA

Enquanto a vida segue em compasso de espera, sem saber o que fazer no período intermediário entre eleições e a posse (e  a pose) do seigneur du chateau, assistir versões cinematográficas de alguns clássicos literários quase que equivale a um mestrado em ciência política.

Nestes tempos a−pós−o−moderno, onde ler se transformou em uma atividade exercida por pobres sonhadores (como diz um dos personagens de 360, o último ato entreguista do cineasta e ex−comunista Fernando Meirelles), ninguém quer perder mais do que uma hora e meia, duas horas, com qualquer atividade que lembre, minimamente, a cultura. Além disso, a estrutura narrativa óbvia do cinema (com inicio, meio e fim − nessa ordem, salvo raríssimas exceções) não exige do expectador um grau intelectual mínimo.

Dito de outra forma: as ruas estão repletas de indivíduos que não conseguem encontrar o óbvio, apesar de tropeçarem nele a todo instante.

Os espectadores que se julgam mais avançados (ou mais inteligentes) deveriam ver (ou rever) O Leopardo (Dir. Luchino Visconti, 1963), adaptação do romance de Giuseppe Tomazi di Lampedusa. A emblemática história de Fabrizio Corbera, Príncipe de Salina, ainda causa espanto em quem possui sensibilidade para se espantar. Durante o Risorgimento italiano, debilitado pela idade, indeciso entre aderir ou combater as mudanças políticas que estão ocorrendo na península, o Príncipe (como compete a um bom governante) está preocupado em impedir que o seu país seja invadido por um dos exércitos em luta. A solução surge da boca de seu sobrinho, Tancredi, que adverte, Se nós não estivermos lá, eles fazem uma República. Se queremos que tudo fique como está, é preciso que tudo mude. A monarquia de Vitor Emanuel II, da casa de Sabóia, ganha um novo aliado – não há nada mais gratificante (ou lucrativo) do que estar ao lado dos vencedores.

Grupos intermediários podem se contentar com um filme mais recente, O Americano Tranquilo (Dir. Philip Noyce, 2002), baseado na narrativa homônima de Graham Greene. A lição mais óbvia, A inocência é uma forma de loucura, aciona o sinal de perigo para determinadas situações, apesar das "boas intenções" que as revestem. Interesses escusos são difíceis de serem detectados, principalmente quando a solução mais sensata é olhar para o lado oposto. No jogo de cartas marcadas em que a má−fé têm preferência, aceitar o aparente implica em ser corrompido pela inércia. A ingenuidade se mostra mais nociva do que a canalhice.

Os aprendizes do arrivismo devem ver Bel Ami (Dir. Declan Donnellan e Nick Ormerod, 2012), adaptação do romance de Guy de Maupassant, e recentemente lançado em DVD. O enredo, atualíssimo, embora esteja centrado na década de 90 do século XIX, tem como protagonista Georges Duroy, um ex−soldado semianalfabeto que espera ganhar algum dinheiro em Paris. O "único" obstáculo para fornecer alguma densidade ao sonho está na completa incompetência para qualquer trabalho que não seja frequentar bordeis ou ficar bêbado. Em seu favor, o rosto bonito e a absoluta falta de caráter. De forma meteórica, a ascensão social ocorre quando Bel Ami (belo amigo), usando da sedução como arma de combate, mergulha em todas as camas que estão ao seu alcance. Enquanto distribui orgasmos às esposas frustradas pelo abandono marital e recheia a carteira com centenas de milhares de francos, a história política de França vai sendo relatada (de maneira oblíqua, de passagem). Em uma narrativa edulcorada pela essência do romantismo, mas de estrutura realista, a carne apodrece a todo instante. A mediocridade assume o poder.

No horror capitalista em que vivemos (também chamado eufemisticamente de neoliberalismo econômico), estudar Política (com "P" maiúsculo) não constitui uma atitude sensata. No entanto, impede que fariseus e idealistas, bárbaros e iluministas, girondinos e jacobinos sejam confundidos.

Uma das tentativas de salvação intelectual está em não desprezar esse tipo de ensinamento.

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