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terça-feira, 14 de maio de 2013

E SE VIVÊSSEMOS TODOS JUNTOS?

São sete personagens: dois casais, um solteirão, um rapaz bem mais novo e um velho segredo. O cenário em que se movimenta a comédia da vida real espelha uma amizade que ultrapassa quatro décadas. Todos estão esperando pela indesejada das gentes – metáfora utilizada por Manuel Bandeira para denominar a morte.

Parte da riqueza do cinema francês está em abordar alguns assuntos espinhosos com leveza, graça e bom humor. O filme E se vivêssemos todos juntos? (Et si on vivait tous ensemble? Dir. Stéphane Robelin, 2012) não foge dessa espinha dorsal. Aliás, a referenda – e sem o menor esforço. 

Quando Claude (Claude Rich) cai de uma escada (estava tentando chegar ao apartamento de uma prostituta), a ideia de todos morarem juntos se concretiza. Foi Jean (Guy Bedos), apesar dos protestos iniciais de sua esposa, Annie (Geraldine Chaplin), quem sugeriu essa possibilidade. Estão todos na faixa dos 70 anos, os filhos criados (malcriados?), morando longe – o que está próximo é a amizade. Cabe então cultivá-la – mesmo que seja por pouco tempo.

Morarem todos juntos se mostra um conceito interessante. Na teoria. Na prática, nem tanto. Albert (Pierre Richard) está caminhando a passos largos para a insanidade. Alterna momentos de lucidez e de demência – por isso anota em um caderno os fatos mais relevantes. Sua esposa, Jeanne (Jane Fonda), cultiva um câncer – que está se alastrando rapidamente.

Como um observador da decadência física e mental do grupo, surge em cena Dirk (Daniel Brühl, de Adeus, Lenin! e Os Edukadores), um estudante alemão que é contratado inicialmente para passear com o cachorro de Albert – e que depois transforma a vida comunitária dos amigos em objeto de estudo para o seu mestrado.

Filme sem pretensões de retratar os elementos dolorosos da velhice, E se vivêssemos todos juntos? desliza pelos olhos do observador como se fosse um poema. Alternando simplicidade e simpatia, relata trivialidades e segredos. São as trapalhadas de Albert que permitem os momentos cruciais do filme. Ele esquece a torneira da banheira aberta e provoca um alagamento. Com a ajuda de Dirk, arromba um baú e encontra as cartas apaixonadas que as mulheres, Jeanne e Annie, enviaram ao amante das duas. Logo depois, sem medir as consequências, como se fosse um dever moral, conta para Jean que Annie o traiu com Claude.

Claude é uma figura. Sem se importar com a idade, freqüenta prostitutas. Assiduamente. Depois do acidente, fica momentaneamente impotente. E isso o deprime. Muito. Pede ajuda para Dirk. Quer uma caixa de Viagra. Dirk, obviamente, fica constrangido com tal pedido. Mas o atende. Causa alegria ao velho libertino. Permite uma das cenas mais engraçadas do filme.

 Por fim, há Jeane – provavelmente o personagem melhor elaborado. Estadunidense vivendo na França desde a adolescência, professora aposentada de filosofia, seus últimos dias reproduzem um arguto exercício estóico. Poucas vezes o cinema (e a literatura) conseguiu mostrar a morte com tamanha dignidade – nobreza que se multiplica no presente que deixou para Dirk (com quem compartilhou alguns dos diálogos mais interessantes do filme).

E se vivêssemos todos juntos? não é obra-de-arte. Provavelmente, muitos espectadores o considerarão como descartável. Nenhum problema. É apenas um filme – desses que fornecem um pouco de lirismo ao peso que a vida coloca sobre os ombros humanos.  

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