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quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

HANNAH ARENDT, IDEIAS QUE CHOCARAM O MUNDO



Durante 18 anos, Hannah (nascida Johanna) Arendt (1906-1975) foi uma apátrida. Entre 1933 e 1951 viveu no exílio – e essa experiência de superar a dor mutiladora da separação (na definição preci[o]sa de Edward Said) marcou de forma decisiva o seu pensamento político. Celso Lafer entende que Na inexistência da tutela jurídica organizada, são os acidentes de simpatia, a força da amizade ou a graça do amor os únicos elementos que oferecem a um refugiado a base precária que confirma a sua dignidade humana.

A ruptura dos laços afetivos é um dos temas centrais de Hannah Arendt, ideias que chocaram o mundo (Hannah Arendt - Die bleierne Zeit. Dir. Margarethe Von Trotta, 2012) – uma radiografia do debate intelectual que acompanhou o livro Eichmann em Jerusalém – um relato sobre a banalidade do mal. Outro tema, a intolerância (intelectual, religiosa, contra a alteridade), complementa a discussão. 

Em 1960, Adolf Otto Eichmann (1906-1962), que estava escondido na Argentina, foi raptado pelo serviço secreto israelense (Mossad). Em abril de 1961, um tribunal foi instaurado em Jerusalém. Hannah Arendt (interpretada por Barbara Sukowa) se propôs a escrever alguma coisa sobre esse julgamento. Em Israel viu uma pessoa assustadoramente normal ser acusada de alguns dos mais horríveis crimes praticados contra a humanidade. O “monstro” nazista não passava de um ridículo burocrata, alguém que seguia ordens sem discutir, que não se desviava da norma estabelecida por seus superiores hierárquicos. Sequer sabia distinguir entre o bem e o mal.


Depois de estudar minunciosamente as transcrições dos depoimentos, Hannah Arendt escreveu uma das peças mais impressionantes da ciência política contemporânea. Publicado em cinco partes na revista The New Yorker, o texto somente adquiriu o formato de livro vários meses depois.

Infelizmente, o pensamento independente e corajoso de Hannah Arendt foi rechaçado imediatamente por parte da comunidade judaica. Nas palavras de Gershon Scholen, ela não tinha Ahabath  Israel (amor pelo povo judeu). Nesses termos, a tese fundamental do livro (e espelhada no filme), o mal como uma característica inata de qualquer ser humano, desapareceu no turbilhão gerado pelo conflito ideológico. O segundo marido de Hannah, Heinrich Blűcher (Axel Milberg), definiu a questão de maneira abrupta: Esse julgamento têm mais a ver com a História em si do que os atos de um homem. Ou seja, as feridas provocadas pelo holocausto eram muito recentes para permitir um distanciamento filosófico e político.

A ruptura afetiva com Hans Jonas e Kurt Blumenfeld, importantes figuras do sionismo alemão, incomodou muito Hannah Arendt. Mais uma vez, ela percebeu que o sentimento de isolamento (tão comum na vida daqueles que em algum momento de suas vidas precisaram abandonar o país em que nasceram) estava se ampliando. A solidão se torna a sua companhia mais assídua. Poucas pessoas possuem forças para suportar a perda de amigos próximos.

Embora discordando de algumas posições de Hannah, Heinrich sempre a apoiou. Mas, não é possível ignorar um pequeno diálogo entre eles, quase ao final do filme:

–Hannah!

– Sim!

– Vão enforcar Eichmann!

– Fazem bem!

– Fazem bem, mas não é justo!

– Acha que a punição não é suficiente?

– A punição é uma justiça aparente.

– Não há punição que baste para os atos dele.

– Por isso seria mais corajoso deixa-lo viver!



Essa discussão apenas reafirma outra frase, que foi proferida em uma conversa entre Hannah Arendt e sua grande amiga, a escritora Mary McCarthy (Janet McTeer), Há coisas que são mais fortes do que um único ser humano.

Independente de julgamentos pessoais ou ideológicos, a vida e o pensamento analítico de Arendt estão aquém da representação cinematográfica.  Mesmo assim, Hannah Arendt, ideias que chocaram o mundo é um filme inspirado.


Conhecida como a aluna favorita de Martin Heidegger, Hanna Arendt teve um caso amoroso com o seu professor quando tinha 17 anos. Quando percebeu que ele simpatizava com os nazistas, o rechaçou afetiva e politicamente. O seu primeiro marido, Gűnter Stern (que mais tarde mudou o nome para Gűnter Anders), era primo distante de Walter Benjamim. Em Paris, Hannah conheceu Bertolt Brecht, Raymond Aron, Alexandre Kojève e Alexandre Koyré – pensadores que (juntos com Karl Jaspers, Walter Benjamim e Martin Heidegger) a influenciaram bastante. Escreveu, entre outros livros, As Origens do Totalitarismo (1951), A Condição Humana (1958), Sobre a Revolução (1963), Homens em Tempos Sombrios (1968).

Um comentário:

  1. Uau, encantador. Gostei da dica ! :O
    Vou procurar ler suas obras, me ajudarão bastante na faculdade.

    Abraços,
    Stefanie O.

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