Fiquei alguns dias sem escrever. Poderia dizer, como Pablo Neruda disse (salvo engano) para Paulo Mendes Campos, que estava enfermo de mi mismo, mas isso seria substituir a comédia diária por um melodrama de quinta categoria. Tampouco posso alegar que o tédio e o cansaço andaram fazendo estragos no cotidiano. Foi o contrário. Esse labirinto (que chamam de vida) está repleto de novidades. Urge ficar preparado para enfrentar – a qualquer instante – o Minotauro, que costuma aparecer nas esquinas do mundo, a querer nos devorar.
Apesar de tudo (ou talvez por isso mesmo) não estão em falta assuntos (verdadeiros ou não) para outras crônicas. Mas, antes que aconteça algum tsunami emocional, resolvi diminuir a velocidade e parar para olhar a paisagem. Motivo? Difícil explicar. Talvez os versos de Belchior forneçam uma pista: Por isso cuidado meu bem / Há perigo na esquina / Eles venceram / E o sinal está fechado prá nós.
O Brasil não é para amadores! Nem mesmo os profissionais sabem indicar o caminho da sobrevivência nessa confusão que armaram ao redor de nós. A tua piscina está cheia de ratos / Tuas ideias não correspondem aos fatos, cantava Cazuza em outros tempos – mas que não estão distantes desses que estamos vivendo. A História é pendular. Os erros são repetidos com frequência assustadora.
Antes que esse texto ganhe destino indevido, vamos corrigir a rota. Enquanto todo mundo espera a cura do mal / E a loucura finge que isso tudo é normal / Eu finjo ter paciência. Tomo emprestadas as palavras de Lenine (o cantor, que o outro, aquele, digamos, mais revolucionário, tinha opinião diferente sobre como se comportar em tempos sombrios). Fingir paciência parece ser um ato de serenidade – ou de desespero contido (no es lo mismo, pero es igual). Isso me fez lembrar outros versos, esses de Zeca Baleiro: Eu digo / Calma alma minha / Calminha! / Você tem muito / Que aprender.
É isso! Nunca deixei de ser aluno, essa palavra que remete os distraídos (meu caso) ao mundo lunar. Incidentalmente, lembro que Cecília Meireles escreveu um livrinho chamado A Lua é do Raul. Descontando os desacertos e essa digressão absolutamente desnecessária, o anagrama Raul / luar sempre me divertiu. E ele combina comigo. Diante de muitas situações, me sinto um extraterrestre! Ou, no caso, um extralunar! De qualquer forma, para o bem ou para o mal, acredito que a existência humana implica em produzir (reproduzir) incidentes, acidentes e gargalhadas. Ou lágrimas. Mistura total de sentimentos, sabores, humores e horrores.
Enfim, o que estou tentando dizer (sem sucesso) é que estou retomando o Diário da Quarentena – mas de maneira mais lenta e nem sempre atenta às complicações do dia a dia. Como (quase) todo mundo, tenho boletos para pagar, livros para ler, músicas para escutar, filmes para assistir. Não dá para fazer tudo ao mesmo tempo. Além disso, quero – na medida do possível – tornar realidade uns dois ou três sonhos e, de vez em quando – se não for pedir muito – reunir uns quatro ou cinco amigos em uma dessas conversas que não levam a lugar algum, mas que ambicionam salvar o mundo.
não seja egoísta. sua palavra, quanto mais costumeira, mais rica para os detentos.
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