Estou com medo – nesta pandemia – de me transformar em um simulacro de quinta categoria do Rodrigo Hilbert. É uma possibilidade remota, convenhamos. Além de me faltar múltiplas habilidades nas tarefas do dia a dia, ninguém consegue competir com o cara – em diversos níveis.
Nunca fui ajudante de ferreiro, desconheço os caminhos da harmonização dos indivíduos com o universo, não faço ioga ou esportes, não domino a arte do origami, não sei cozinhar (ou assar pães ou fazer pudins), não casei com celebridade artística e jamais pensei em ter um quadro em programa na televisão.
Olhando dessa perspectiva, estamos a quilômetros de distância interestelar. E isso talvez seja a incontornável vantagem. Por outro lado,...
Estou adquirindo algumas habilidades, no estilo elegance avec decadence, que não podem ser desprezadas. Embora eu não seja belo, recatado e do lar, tenho me esforçado para valorizar as nuances que envolvem a economia doméstica: lavo a louça, jogo o lixo fora todos os fins de tarde, limpo o banheiro, troco a roupa de cama, faço gelatina, sei (mais ou menos) usar o micro-ondas e considero o papel-toalha uma das grandes invenções da humanidade. Tenho relativo gosto musical, jogo xadrez (provavelmente melhor do que ele!!) e conheço um pouco de literatura e cinema (o suficiente para enganar a torcida!).
Não posso usar o parâmetro fashion. Basta o sujeito aparecer na televisão e a minha autoestima diminui. Até de moletom ele fica bem vestido. Eu, em compensação, estou reduzido ao mínimo. Em casa, uso bermuda, camiseta, chinelo. São os trajes profissionais de quem está limitado fisicamente pela peste contemporânea e vivendo essa coisa anódina que chamam de home working. Só coloco calça e tênis quando preciso sair para resolver algum problema (banco, supermercado, farmácia).
Outro dia, ao olhar para o guarda-roupa aberto, constatei (em algum momento, sem saber o porquê) que deixei de usar camisas. Foi uma sensação estranha. Enfileiradas nos cabides, sem grande utilidade, elas estão se parecendo com itens em promoção nas lojas de departamentos. Imediatamente, sem pensar duas vezes, fechei a porta e me afastei daquela imagem melancólica. Provavelmente terei que me desfazer de algumas quando o Covid-19 for domesticado.
(Em tempo: preciso enviar para ele, ou para algum outro consultor televisivo da área, uma pergunta bastante pertinente na atualidade: qual a melhor marca de creme para as mãos – estou precisando. Também preciso ir ao barbeiro e à manicure.).
Voltando ao tema principal desse discurso
narrado por um idiota, cheio de som e fúria, e significando nada, Rodrigo
Hilbert é o protótipo do homem moderno, que foi desconstruído no tempo
histórico, e ressignificado na tela da televisão. Nos momentos que a maldade
atravessa o meu olhar, fico torcendo para que ele mostre algum defeito, uma
iniquidade qualquer. Não precisa ser uma monstruosidade, alguma violência física
ou traição conjugal. Ficaria satisfeito com algo mais modesto, uma frase
escrita com erro gramatical, uma multa de trânsito ou a confissão de que gosta
de chuchu. Infelizmente, os deuses não querem atender os meus pedidos. Preferem
manter intacta a imagem da perfeição. É o horror, o horror!
Querido, só tens um defeito: acompanhas o Rodrigo na tv? tas frito cara
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