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segunda-feira, 16 de maio de 2022

CINQUENTA POEMAS QUE RELEIO FREQUENTEMENTE (3ª PARTE)

 



ESPERANDO AS BÁRBARAS

(Marília Kubota)

 

barbie, tippie ou como você chame,

janet, condoleza, lynndie,

não é mais que uma boneca.

não como konstantin,

que amava os homens e por eles caiu

nos bordeis de Alexandria

anunciando homens

como os de vocês.

vocês são demais.

 

anseiam romances

enquanto seus homens explodem cabeças

de porco no mundo velho.

 

vocês sabem tudo sobre sexo

e leem revistas pornográficas em banheiros iluminados,

controlando hormônios.

 

vocês são híper.

 

jovens americanas, como vocês, mas do sul,

também ousadas, desde os dez anos vendem o corpo

para comer. os abutres comem delas.

 

vocês ensinam as mulheres a serem liberadas

usando as mais modernas técnicas

para conseguir prazer.

 

Todas as mulheres do mundo aguardam o ritmo

que a superestrela virgem ditará,

apertada em corpetes e botas militares.

vocês são o rosto das mulheres do mundo.

o que será de nós sem as barbies?



CASAMENTO

(Adélia Prado)

 

Há mulheres que dizem:

Meu marido, se quiser pescar, pesque,

mas que limpe os peixes.

Eu não. A qualquer hora da noite me levanto,

ajudo a escamar, abrir, retalhar e salgar.

É tão bom, só a gente sozinhos na cozinha,

de vez em quando os cotovelos se esbarram

ele fala coisas como ‘este foi difícil’,

‘prateou no ar dando rabanadas’

e faz o gesto com a mão.

O silêncio de quando nos vimos pela primeira vez

atravessa a cozinha como um rio profundo.

Por fim, os peixes na travessa,

vamos dormir.

Coisas prateadas espocam:

somos noivo e noiva.

 

 

TEIA

(Orides Fontela)

 

A teia, não

mágica

mas arma, armadilha

 

a teia, não

morta

mas sensitiva, vivente

 

a teia, não

arte

mas trabalho, tensa

 

a teia, não

virgem

mas intensamente

                  prenhe:

 

no centro

a aranha espera.

 

 

Tarot

(Assionara Souza)

 

Vou confessar, querida

Tenho isso de gostar dos loucos

Observo de longe o jeito que eles comem com os olhos

Com você foi assim

Esse esmalte vermelho sempre em dia

Esse passado colado no álbum com cantoneiras e papel vegetal

Quero a receita completa

Desde o suspense antes do desfecho da trama

O disparo, teu olho assustado pra câmera

Por trás da palavra pêssego

corre um rio espesso

Mordo a palavra pêssego

E as comportas desabam — uma cidade inteira vem abaixo

Corremos, corremos para bem longe do set de filmagens

Vida real é um cão dormindo no silêncio da tarde de um domingo

 

 

querida sara,

(Alessandra Safra)

 

agradeço sua umidade nessa tarde ardida tão seca. sobre a

recusa de flores, preciso esclarecer que não aprecio esse

roubo da natureza apenas você [como sempre] basta.

 

Agradável sua visita nesse domingo insípido, aliás, todos

os domingos minhas ilusões tiram folga e esse mal estar

acumulado me força olhar para o ridículo dessa peleja

diária. estava afundada na cólica desses farelos quando

você me salvou com seu instinto de vida.

 

bom passar o tempo sob & sobre seu corpo ouvindo a

música dos seus gemidos.

 

Se puder, volta para me salvar no próximo domingo

também.

 

beijos

Anna S.

 

 


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