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terça-feira, 3 de janeiro de 2023

O HUMOR FERINO DE AGRIPPINO GRIECO EM QUARENTA E CINCO FRASES

 


– A burrice é contagiosa; o talento, não.

– No dia que tiver uma ideia, morrerá de apoplexia fulminante.

– Passou a vida correndo atrás de uma ideia, mas não conseguiu alcançá-la.

– No dia que tiver uma frase de espírito, despedem-no.

– Há sujeitos muito burros que às vezes conseguem fazer uma coisa boa. É a faísca da ferradura na calçada. 

– Esse político queria estabelecer um acordo entre os brasileiros, quando não era capaz de estabelecer um acordo do sujeito com o predicado, numa oração.

– Sempre votou ódio de morte a uma sisuda senhora chamada Gramática.

– Era um deputado conservador. Seu único programa político era conservar a sua cadeira na Câmara.

– Cobriram-no de adjetivos poéticos, mas ele queria apenas um substantivo prosaico: dinheiro.

– Um fauno carecendo de afrodisíaco.

– Inútil como um tenor resfriado.

– Era um pêndulo, oscilando entre a ignorância e a má fé.

– Sempre indeciso entre o preciosismo e a vulgaridade.

– Os caminhos da literatura sempre estiveram cheios de perigosos salteadores.

– Ruminava frases pastando em livros alheios.

– Há nele um canário e um gato. O gato sempre querendo comer o canário.

– Fulano nunca esteve nos seus melhores dias.

– Insultavam-se mutuamente, e ambos tinham razão.

– Ele era mais preocupado com o estilo dos móveis que com o estilo de Flaubert.

– Cultivava paradoxos e rabanetes.

– Tinha um estilo mais engomado que irmãs de caridade.

– Aquele médico, deixando de clinicar, passou a escrever. Lucraram os doentes, perdeu a literatura.

– Na praia das virtudes, a água é muito suja.

– A obra é ilustrada; o autor, não.

– Seu livro deveria ser encadernado em pele de jumento. Coerência com o conteúdo.

– Era um livro raro. Mais raro, entretanto, era quem o procurasse.

– Dele, só lerei as obras póstumas.

– Irá longe! Foi para Montes Claros.

– Defendia a Polônia nos botequins e esbordoava a esposa em casa.

– A principal personagem daquele romance era mesmo o tédio.

– Seu estilo tinha a elegância das burguesas endomingadas.

– Ele inventou que era inventor.

– Suas estreias eram espetáculos de despedida.

– Aplaudem porque acabou.

– Era um camelo no Saara das ideias.

– Quanta gente influiu na originalidade de F.!

– A seca é terrível; mas, pior é certa literatura provocada pela seca.

– Sarna: uma das poucas distrações que restam aos pobres.

– Menotti del Picchia, parnasiano, querendo passar por modernista, lembra atrizes de 70 anos a se fazerem de ingênuas.

– Ele é mais mentiroso que epitáfio de cemitério.

– Em 1960, eu era funcionário do Ministério da Viação e ia ser promovido. O decreto estava lavrado. Mas fui fazer um discurso para o Aarão Reis, meu chefe, e não me contive. Disse que ele era “o primeiro dos nossos engenheiros, em ordem alfabética”. Ganhei a frase e perdi o cargo. 

– Tenho uma memória trágica, recordo tudo. Se houvesse fosfato para diminuir memória, tomava. Às vezes ela dói.

– O Jorge Amado trocou a Gabriela pela Tereza Batista. É o lenocínio literário.

– O Carneiro Leão entrou para a Academia. Estranhei: – Até agora os animais tinham entrado de um a um. Dois de uma vez é demais.

– Não tenho balança de justiça. Tenho amores e rancores. Tudo em mim é gratidão e vingança.

 

Foto que está na capa do livro Gralhas e Pavões, lançado em1988. Em pé (da esquerda para a direita): Jaime de Altavilla. Romeu de Avelar,
Jorge de Lima e Osman Loureiro. Sentados: Pontes de Miranda, Vinicio da Veiga,
Agrippino Grieco e Theo Filho. 


Agrippino Grieco (1888-1973) foi um importante crítico literário brasileiro, editor da revista Boletim de Ariel. Com um estilo virulento, muitas vezes próximo da agressão, demoliu com algumas pretensões literárias do século XX. Publicou muito, mas o livro que causou maior escândalo foi aquele em que esculhambou com a obra de Machado de Assis – o que deu motivos para uma interessante polêmica, através dos jornais, com Afrânio Coutinho e Augusto Meyer.


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