A poesia não vale o
papel em que é impressa. Incontáveis vezes esse tipo de argumento se repete. E
parece estar absolutamente correto – mas por motivo oposto ao do declarante. A
poesia não tem preço. Não é mercadoria.
Sequer há utilidade
para a poesia. Usualmente trata-se de algo que atrapalha os dias de praia e
sol, que incomoda aos que gostam de astronomia e astrologia, que tem a
aparência dos peixes abissais ou dos animais extintos.
Um verso expande a
potência do verbo, despreza a verba, reverbera o vazio e institui o caos. O
pensamento se desdobra em novas presenças, ausências, referências e
reticências. A árvore que recusa o asfaltamento do bom gosto.
Uma estrofe não
compactua com o silencio e institui as frases com a violência dos vulcões que entram
em erupção na primavera – exatamente quando todos julgam estar a salvo. A poesia incendeia a planície – ao som da onça com fome.
A linguagem como
resistência. Empilhar sentimentos e inaugurar catedrais de
vento. A iluminação obliqua, a sombra inesperada, a sobra. A vida dividida entre
projetos falidos e noites turbulentas. A prece dos que não acreditam em deus.
A poesia respira a
imensidão da Antártida no equinócio. Detesta compactuar com as certezas. Acrescenta
novas dúvidas. Sabe que o nascer da manhã confirma a desventura, nega a
usura, abomina a clausura.
A poesia não escolhe
caminho, nem ordem, nem ideias, nem se detém diante do iníquo. A expansão é o
seu destino, desatino de quem escolhe acolher em abraços os que estão satisfeitos
com a imensa coleção de equívocos.
A poesia não faz
prosa, não carrega ramalhetes para o amor, não suporta paredes ou comporta
escafandros. O poema gosta da palavra sim, mas prefere dizer não. E isso afasta
a discussão, propõe a digressão. A poesia é a poesia e em si se
basta.
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