Study of Rachel Russel (oil on panel). Edwin Henry Landseer (1802-1873) |
No final de dezembro é comum fazer retrospectivas,
resenhas e listas dos melhores livros do ano. Ou então, como prova de leitura,
relacionar aqueles de que mais gostamos nos últimos 365 dias. Considerando que
não me iludo com as boas intenções que envolvem (com papel de embrulho
colorido) esse tipo de interação, deixarei a tarefa para outros. Além disso,
gosto se discute – e a minha avaliação (que é bastante limitada) raramente
coincide com qualquer coisa que poderia ser chamada de senso comum.
Prefiro a contenção dos elogios – o de hoje pode ser a vergonha de amanhã. Acredito que o melhor juiz é o tempo, que não se curva à euforia que acompanha a precipitação.
Detesto listas. Não importa o critério adotado, esse exercício está centrado na ausência e seus sinônimos: falta, omissão, negação, exclusão. Muitas vezes também dão um passo na direção do equívoco. Afirmar que estes ou aqueles são os melhores livros do ano é de uma temeridade que assusta. Acaso o autor da classificação leu TODOS os que foram publicados no país? Obviamente que não. Ninguém tem tempo ou paciência para ler cinco mil livros (romances, contos, poemas). Talvez os leitores vorazes consigam ler uns cem. Ou menos. Bem menos.
E os livros premiados em concursos? Também não devem ser acolhidos como integrantes das listas dos melhores? Ora, ora! Cada concurso possui regras específicas e um corpo de jurados que... na falta de expressão mais civilizada, agem de acordo com interesses diversos daquele que os ingênuos chamam de qualidade (um conceito difuso, sem substância). Prêmios (salvo raras exceções) atendem aos interesses da indústria editorial.
Prefiro continuar incentivando a leitura, sem declarar preferências, sem tentar cooptar seguidores e patrocínios. Quem trabalha com a cultura possui um inimigo muito poderoso: a comercialização (monetização). E, infelizmente, poucos “ativistas culturais” conseguem resistir ao canto da sereia. A sobrevivência sempre foi a desculpa perfeita para aqueles que Circe transformou em porcos.
A Internet está repleta de indicações literárias (vídeos e comentários escritos) que em nada diferem do marketing mais infame. Youtubers transformaram a literatura em carnaval (impulsionados por editoras amigas). Com uma linguagem que se aproxima do coloquial e se afasta da crítica literária, distribuem elogios como se fossem confetes e serpentinas. Em cerca de 80% é mais do mesmo, ignorando a regra básica do minimalismo: menos é mais.
Mas, por favor, não entendam que estou defendendo algum absurdo como a arte pela arte, literatura pela literatura. Nada disso. O que gostaria de destacar é que é necessário, na trincheira, saber o grau de credibilidade de quem está ao nosso lado. Os representantes da indústria literária (e seus vassalos) certamente não são confiáveis. Nunca foram. E não será agora que mudarão o roteiro da procissão. Inclusive porque o santo de devoção é outro.
Por fim, para que não restem dúvidas, qualquer leitura sempre será melhor do que nenhuma. Pouco importa se o leitor gosta dos clássicos ou da literatura erótica, dos dramalhões ou da ficção científica, dos ensaios ou das histórias em quadrinho. O importante é ler. Quanto mais, melhor.
Que, em 2021, as bibliotecas públicas se
multipliquem.
Nenhum comentário:
Postar um comentário