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domingo, 5 de julho de 2020

DIÁRIO DA QUARENTENA (CV)



Quando os historiadores escreverem sobre o que significou 2020 na vida dos brasileiros, provavelmente precisarão começar com a longa lista de artistas mortos durante esse ano aziago. As perdas humanas se somam com a desmontagem da estrutura cultural do país – promovida por um governo que prefere a ignorância ao saber.   

No momento em que a ex-Secretária Nacional de Cultura (uma pessoa sem o mínimo entendimento sobre como funciona a estrutura burocrática e política de um organismo de Estado) disse que desconhecia a obra de várias personalidades que haviam falecido recentemente, não estava mostrando o eterno descaso com que a pátria amada trata os artistas, estava refletindo o pensamento que oscila entre a performance do discurso neonazista e a ascensão dos medíocres nessa miragem que é o poder.

Fausto, travestido de artista, faz pactos com Mefistófeles diariamente. Isso não é surpresa para ninguém – como advertiram vários filósofos. O que causa horror é o momento em que os indivíduos perdem a capacidade de análise, de percepção do processo civilizatório, e, em grau extremo, negam o direito à vida.

Leonardo da Vinci escreveu que “A arte diz o indizível; exprime o inexprimível; traduz o intraduzível”. Ele estava indicando um caminho: que existem valores que não podem ser catalogados pela racionalidade ou pela economia de resultados. Também estava dizendo que as artes plásticas, o teatro, a literatura, a música e as demais formas artísticas podem ajudar a evitar a barbárie.

Nestes tempos de pandemia, onde a solidão se faz presente a cada instante, a arte tem sido extremamente útil para evitar tragédias e confortar aqueles que estão próximos do descontrole emocional. O universo adquire sentido quando um artista o interpreta e reparte com as pessoas o seu trabalho.

Não quero chorar todos os dias por aqueles que que nos deixaram em 2020. Ao mesmo tempo, não quero esquecê-los. A lista está incompleta, é difícil lembrar todas as perdas:

Cinema e Teatro: José Mojica Marins, Susana Amaral, Flávio Migliaccio, Leonardo Villar, Maria Alice Vergueiro.

Artes Plásticas: Ricardo Brennard, Rossini Perez, Nelson Leiner, Luiz Azulay, Abraham Palatinik, Christo.

Música: Moraes Moreira. Luiz Vieira, Carlos José, Tunai, Cláudia Telles, Adelaide Chiozzo, Riachão, Naomi Munakata, Martinho Lutero Galati.

Literatura: Jorge Salomão, Marcelo Dolabela, Sergio Noronha, Rubem Fonseca, Sergio Sant’Anna, Luiz Alfredo Garcia-Roza, Nirlando Beirão, Tereza Tenório, Afonso Arinos de Mello Franco, Ruy Fausto, Aldir Blanc, Ciro Pessoa, Olga Savary, Luiz Maklouf Carvalho, Fernando Py, Nonato Gurgel, Antônio Bivar.        


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