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quarta-feira, 29 de abril de 2020

DIÁRIO DA QUARENTENA (XXXVIII)



A quarentena, que limitou os deslocamentos no espaço físico, permitiu que o mundo virtual ganhasse um espaço que, durante muito tempo, era reservado apenas aos nerds e geeks. O que antes era nicho de uns poucos “escolhidos” está se transformando em uma espécie de ágora pós-moderna – onde os mais diversos tipos de manifestações e discursos encontram lugar de existência. Todo dia há lives, shows, encontros de discussão, manifestos, etc. Basta ligar o computador e procurar por assuntos e grupos de interesse. Nos últimos dias, foi possível participar de alguns desses eventos.


Guilherme Terreri Lima Pereira ou Rita Von Hunty

O grande momento da tarde de 27/04 foi protagonizado por Guilherme Terreri Lima Pereira. Sem economizar críticas sobre a política social vigente no Brasil, durante uma hora, de maneira objetiva e com incrível didática, Guilherme mostrou os desníveis socioeconômicos que caracterizam um país que não consegue superar o preconceito contra os pobres, os negros, os índios, as mulheres e os homossexuais. Foi uma aula. Assistiram ao evento um pouco mais de 950 pessoas (no encerramento eram 1050). Isso significa que foi um estrondoso sucesso. Ah, Guilherme também é conhecido como Rita Von Hunty.

Ontem (28/04), o convidado da editora Aleph era “apenas” John Scalzi, uma das estrelas, digo, uma das constelações do gênero literário que – para o bem ou para o mal – reflete o momento histórico que estamos vivendo: a ficção científica. Bebendo Coca-Cola e respondendo as perguntas óbvias com bom humor, ele vendeu o peixe com relativa competência. O público oscilou entre 100 e 130 pessoas.

John Scalzi

Lilian Moritz Schwarcz explicou os fundamentos do autoritarismo brasileiro, em vários momentos nos últimos dias. Baseada em pesquisas históricas, discorreu sobre alguns dos mais significativos temas da historiografia nacional.

A grande decepção ficou por conta de Conceição Evaristo. Por três vezes tentei ver essa força da natureza literária brasileira. Com visíveis problemas de conexão, ela precisou cancelar os eventos. Se houver outra oportunidade... estarei na primeira fila, ansioso por vê-la!

Luisa Geisler, Ana Paula Maia, Jarid Arraes, Natália Borges Polesso e Carol Bensimon deram um colorido especial ao Festival de Literatura Brasileira Na Janela, promovido pela Companhia das Letras, nos dias 24, 25 e 26 de maio. Foi impactante a forma como descreveram, cada uma a sua maneira, o universo da criação literária. E comprovaram – mais uma vez – que são as mulheres que conseguem interpretar com mais acuidade os problemas da contemporaneidade.  


José Ribamar Coelho Santos ou Zéca Baleiro

A música também tem se mostrado um fator agregador. Sucesso de público e crítica foram os shows de Zeca Baleiro, João Bosco e Zélia Duncan. Nando Reis também “deu o ar da graça”, mas em situação diferenciada: foi financiado e pediu doações para compra de equipamentos médicos para combater o Covid-19. Aconteceram outras apresentações: algumas – infelizmente – não consegui assistir; outras (sertanojo e dor-de-corno) – felizmente – não vi e ouvi.

Cada um enfrenta o confinamento da melhor maneira possível. Entre os que entram em depressão e aqueles que abrem a janela e – de uma forma ou de outra – participam das atividades que se desenvolvem lá fora, me parece mais salutar (mentalmente) a segunda opção. Open the windows surge como um conselho sensato e um trocadilho irônico.  

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