Não se fazem mais intelectuais como antigamente. Não no sentido romântico do termo. Basta ver alguns chatos engravatados, que andam ditando normas e comportamentos por ai. Cheios de condecorações acadêmicas e um profundo tédio pelo mundo concreto, esses sujeitos se escondem no discurso técnico, que sabe tudo, que domina tudo e tende a resolver os conflitos "administrativamente". Defensores da esterilidade, procuram evitar as discussões e as pulsações do desejo. Travestidos de intelectuais, esses fascistas são incapazes de combater o autoritarismo das instituições. Enquanto edulcoram as relações sociais com um discurso ambíguo, fazem o jogo do poder e se locupletam com as migalhas da miséria capitalista.
Karl Kraus (1874−1936) foi o contrário. Importante ativista cultural austríaco, publicou revistas, panfletos, livros. Sem ser cerceado por essa idiotice que é o politicamente correto, tinha opinião sobre tudo e não sentia medo de as manifestar, notadamente em Die Fackel ("A Tocha") - revista em que, salvo raras exceções, foi o único redator durante quase quarenta anos.
Foi um desses sujeitos que não existem mais e que, independente de certas questões, desafiaram o poder todas as vezes que acharam necessário.
Alguns de seus aforismos ficaram célebres.
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− Muitos desejam me matar. Outros, passar uma horinha conversando comigo. A lei só me protege dos primeiros.
− Mesmo um homem decente pode – contanto que isso jamais se descubra – construir hoje em dia um nome respeitável.
− Antes de suportar a vida, convém tomar anestesia.
− O nacionalismo é o amor que me liga aos imbecis do meu país, aos ofensores dos maus costumes, e aos violadores da minha língua.
−O que são todas as orgias de Baco diante dos êxtases daquele que, desenfreadamente, se entrega à abstinência?
− A perspicácia da polícia é o dom de considerar todo homem capaz de um furto, e a sorte é que a inocência de muitos não pode ser provada.
− Não se pode confiar no esnobe. A obra que ele elogia pode ser boa.
− Ao comer, ele não deixa que nenhum apetite estrague o seu aborrecimento.
− Em casos duvidosos, decida−se pelo correto.
− Ela ingressou no casamento com uma mentira. Era virgem e não lhe disse nada.
− A mulher entra com seu sexo em todos os empreendimentos da vida. Às vezes até no amor.
− Uma mulher que não pode ser feia não é bela.
− Para a perfeição lhe faltava um defeito.
− Ela disse a si mesma: Dormir com ele, sim – mas nenhuma intimidade!
− Maldita lei! A maioria dos meus concidadãos é o triste resultado de um aborto não realizado.
− Nada á mais tacanho que o chauvinismo ou o racismo. Para mim, todos os homens são iguais, em toda parte existem imbecis e tenho igual desprezo para com todos. Mas nada de preconceitos mesquinhos!
− A mulher total engana para ter prazer. A outra tem prazer em enganar.
− Frente às mulheres, a ordem social nos destina a ser mendigo ou ladrão.
− A tarefa da religião: consolar a humanidade que caminha para a forca; a tarefa da política: torná−la desgostosa da vida; a tarefa do humanismo: abreviar a sua espera pela forca e envenenar a comida do carrasco.
− Muitas vezes uma mulher é um substituto perfeitamente utilizável para a auto−satisfação. Naturalmente é preciso uma boa dose de imaginação.
− É preciso ler duas vezes todos os escritores, os bons e os ruins. Os primeiros serão reconhecidos; os outros, desmascarados.
− "Escrever bem", sem personalidade, pode bastar para o jornalismo. Eventualmente, para a ciência. Nunca para a literatura.
− Ideias estão isentas de impostos alfandegários. Mesmo assim, há problemas.
− Medicina: a bolsa e a vida!
Houve um tempo, em passado não muito remoto, que Viena era o centro do mundo!
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