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segunda-feira, 6 de junho de 2011

SOMEWHERE, BY SOFIA COPPOLA

Gosto de Sofia Coppola. Provavelmente foi The virgin suicides (As virgens suicidas, 1999), a interessante (e quase literal) adaptação do romance de Jeffrey Eugenides, que estabeleceu as bases dessa devoção. Depois teve Lost in translation (Encontros e desencontros, 2003), que é um filme genial. Metade do mundo ficou boquiaberto com esse "tour de force". Bill Murray e Scarlett Johansson fazem um par inesquecível, perdidos nas ruas de uma Tóquio neurótica, sem identidade, anti−japonesa. Impossível não aplaudir. De pé. Quinze minutos. No mínimo.

Algum tempo depois, Sofia levou um choque de realidade: o triste retorno ao normal. O foco narrativo favorável à questão feminina, as discussões sobre a cena dos sapatos, a exuberância dos filmes de época: nada disso foi suficiente para dar a necessária substância à Maria Antonieta (2006), que é um filme beirando o artificial, o quase descartável. Falta algo. Ou pior, sobra algo. Alguns fãs perderam um pouco da fé.

Quando Somewhere (Um lugar qualquer, 2010) ganhou o Festival de Veneza, alguém (não lembro quem) me disse que o talento tinha voltado. Será?, perguntei um pouco descrente, um pouco esperançoso.

Na locadora, encontro uma cópia do filme. Em casa, taça com malbec ao alcance da mão, deixei Sofia me mostrar seu novo trabalho. Uma hora e meia depois, enquanto os créditos rolavam pela tela, um pouco de decepção. Queria mais − outra vez.

Histórias de desencontros entre pais e filhos sempre garantem a simpatia do espectador. Somente são superadas por aquelas protagonizadas por doentes ou animais. Quem possui senso crítico não pode aceitar esse tipo de armadilha.

A história do ator Johnny Marco (interpretado com competência por Stephen Dorf) em quase nada difere de outras histórias de sucesso profissional e fracasso emocional. A solidão é anestesiada por álcool e aventuras sexuais supérfluas (as gêmeas do pole dance mimetizam a beleza e o enfado desse estilo de vida).

A presença da filha, Cleo (interpretada por Elle Fanning), estabelece outro andamento ao filme, embora a ação narrativa continue lenta, tediosa – como comprova a quantidade angustiante de cenas com câmera fixa (ritualização de um cinema primitivo, onde gruas e recursos tecnológicos não atrapalhavam a cadência narrativa).

Da mesma forma com que Clio, a musa da História, empurra alguns acontecimentos para a lata de lixo, Cleo proporciona algum movimento ao que era estático. É a presença da filha, crivando o pai com olhares amorosos, que descarta a lentidão afetiva. É a ausência da filha que resulta na patética confissão de culpa paterna, quase ao final do filme: "I’m a fucking nothing".

Depois de admitir a mediocridade, a redenção. Essa é a regra do jogo narrativo. É a vitória dos ideais hollywoodianos, que imaginam "happy end" para todas as histórias. Sofia escolheu outra proposta: o anti−clímax do final aberto. Ou seja, menos envolvida com as preocupações de garantir o investimento e o lucro, a cineasta parece querer nos dizer algo além do expresso nas imagens. Talvez ambicione sugerir que caminhar para o interior do país, para o interior de si mesmo, seja uma das formas de expulsar a solidão.

O filme é bom, embora fique devendo. Além disso, não evita a sensação de "deja vù". A desterritorialização, a dificuldade em encontrar o bem−estar, está presente em todos os outros filmes de Sofia Coppola: as meninas de Virgens Suicidas, os americanos em Tóquio, a "austríaca" na corte francesa. E todos esses personagens infelizes expõem a fragilidade humana.

2 comentários:

  1. Gostei muito do seu olhar. Também sou admirador da Sophia e de sua tentativa de escapar da "bula de remédios" do cinema americano, de um modo geral. Vou ver "somewhere". Obrigado pela dica. abs.

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