A polícia brasileira é mais competente do que a polícia estadunidense. Essa conclusão elementar resulta de comparação entre dois casos similares. A polícia federal estadunidense (Federal Bureau of Investigation − FBI) sofreu para identificar o responsável pela subtração e divulgação de algumas imagens (todas muito comportadas) de atriz hollywoodiana Scarlett Johansson. Vários processos judiciais ainda estão em curso, a título de compensação financeira e punição dos criminosos. Ao mesmo tempo, para alegria dos tarados, esse material (que foi publicado em diversos veículos de comunicação − jornais, revistas, internet) ainda pode ser encontrado em alguns sítios do mundo virtual.
Em terras tupiniquins, causou espanto a presteza com que foi resolvida a circunstância que envolveu uma dessas celebridades descartáveis sem grandes atributos (físicos, artísticos, intelectuais). Como se fosse um caso de segurança nacional o aparato policial não mediu esforços para elucidar rapidamente o crime. Alguns dias depois que o fato se tornou público, vários "culpados" foram apresentados à mídia − que gastou dezenas de baldes de tinta com esse imbróglio.
A coleção de fotos saiu do computador da moça. Dizem que ela, comprovando ter quociente de inteligência menor que zero, preencheu − de livre e espontânea vontade − o formulário anexado a uma mensagem eletrônica enviada por destinatário suspeito. Ou seja, abriu as portas dos arquivos e disse: Sirva−se, senhor cracker (não confundir com hacker, que é outra coisa). Um vírus espião se instalou na máquina e "surrupiou" diversos arquivos privados.
Como sempre acontece nessas situações, não satisfeito com o resultado da traquinagem, um dos envolvidos no furto pensou (ou "não pensou") que poderia ganhar uns trocados – e mudou a tipificação criminal do evento.
A chantagem não teve sucesso, um dos advogados mais espalhafatosos e caros do Brasil (segundo a revista Piauí) foi contratado, a polícia não perdeu a chance de conseguir alguma publicidade positiva, a emissora que emprega a atriz fez várias matérias "jornalísticas" sobre o caso. Enfim (como em uma daqueles folhetins televisivos em que rostos anódinos costumam executar singulares canastrices em horário pobre), todos foram felizes para sempre.
Apesar desse carnaval (em que a indústria de marketing que cerca os ávidos por fama momentânea forneceu assessoria inestimável), o principal motivo de assombro com o sucesso da operação policial foi outro: no Brasil em que os órgãos de proteção da ordem e do progresso do Estado atiram primeiro e perguntam o que aconteceu depois, a integridade física da gurizada (um bando de amadores inofensivos) que invadiu o computador da loura aguada foi preservada. Tanto que um deles, quando identificado, foi filmado por uma equipe "jornalística" especialmente contratada para documentar a festa. A cordialidade desse encontro era tamanha que o acusado quase ofereceu cafezinho ao esquadrão fortemente armado que o estava visitando.
Não tenho certeza se essa encenação seria possível se o suspeito tivesse acentuada dose de melanina, fosse desprovido de fontes financeiras e com baixa escolaridade. Há a possibilidade das manchetes dos tablóides, na manhã seguinte, o descreverem como traficante morto ao resistir à prisão.
Também não tenho certeza se a mídia desfrutaria de todo esse desfile de egos ávidos por atenção se a vítima fosse mulher moradora da periferia, dois ou três filhos, renda mensal igual (ou inferior) ao salário mínimo. Possivelmente o inquérito mofaria em alguma gaveta de delegacia − há diligências mais importantes para serem atendidas pelo serviço policial nacional do que chilique histérico de alguma mal−amada.
Em contrapartida, a atriz atroz (humilhada e ofendida por tanta maldade "gratuíta") não hesitou em desfilar na avenida. Concedeu várias entrevistas ao seu canal de televisão favorito e, com voz melíflua, se declarou indignada. Exigiu medidas enérgicas contra quem ousou tornar públicas algumas de suas fotos de estimação. Tamanho pudor seria irônico, não fosse ridículo. A moça já posou para a revista Playboy - e isso significa que o país inteiro já conhece, em detalhes maquiados pelo photoshop, as suas qualidades mais louváveis.
Apesar de toda a "seriedade" da situação, a Prima Donna esqueceu de mencionar que fração dessa repulsa estava dividida em duas quantias. A primeira (e mais importante) é que as suas fotos insípidas (algumas não conseguem excitar nem mesmo um monge trapista, tamanha é a ausência de sensualidade e erotismo) não resultaram em qualquer acréscimo na sua conta bancária. No mundo em que as imagens dos corpos estão à venda nas bancas de revistas, desnudar a carcaça gratuitamente equivale ao desvalorizar a si mesma. A segunda é consequência da primeira, salvo algum equívoco publicitário, ninguém vai querer pagar para ver um corpo que está exposto na internet.
Resumo da ópera: a estrelinha sem brilho, que não mais cozinha na primeira fervura (a idade promove estragos irreparáveis!), conseguiu obter alguma vantagem com esse episódio. Provavelmente, a título de compensação por "tamanha dor", estragará a próxima novela das oito (aquela que começa às nove e meia).
P.S: Apesar das regras que envolvem o politicamente correto, não é possível ignorar que o sobrenome da ex-Teodora (personagem televisiva que provavelmente nunca foi chamada de Carol−linda) ecoa como propaganda duvidosa: dick man.
Dileto Raul:
ResponderExcluirTexto testo. Maravilhoso e repleto de verdades. Texto que deveria ser enviado para a "estrelinha sem brilho". Talvez, digo "talvez" ela caísse na real, como dizem. O "talvez" é realmente pela dúvida, pois creio que a "cabecinha" deve ser realmente vazia - e, com certeza necessitaria da opinião do senhor advogado "espalhafatoso".
Congratulações.
Literalmeida: obrigado pela leitura e pelo comentário! Em um mundo de superficialidades, onde as celebridasdes instantâneas ditam as regras do comportamento social, precisamos estar atentos e marcando posição contra! Abraços!
ExcluirInfelizmente vivemos num país sem educação de qualidade. Está aí o resultado..celebridades, ocas , em alta, fazendo a festa do povo, enquanto um bando de bandidos ( os verdadeiros e perigosissimos bandidos) estão... soltos por aí, os piores, disfarçados de gente do bem, comandando este país e cometendo, dia após dia, um dos piores crimes( pena máxima seria pouco pra eles) de negar educação ao nosso povo. Deixei esse comentário no Espaço Indigo, mas não sei se chegou a ver. Muito bom seu texto sobre o assunto!
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