William Arthur Philip Louis, 29 anos, provável herdeiro do trono inglês, vai casar. Dia 29 de abril de 2011. A eleita (que nunca sofreu – ou sofrerá − o escrutínio popular), Catherine Elizabeth Middleton, Kate para os íntimos, 29 anos, aceitou a tarefa de substituir a mãe, a mãe do noivo, aquela mesma que, 14 anos atrás, foi imolada pela voracidade do consumo capitalista, aquela que literalmente ardeu nas chamas da fama, envolta no glamour somente possível em França (país que adora brincar de incinerar Joana d’Arc).
The Princess is dead. Long life for the Princess!
Middleton, sobrenome adequado para uma futura rainha, numa tradução canhestra, uma porção média, soando eufonicamente como middle town, está descobrindo que London London é aqui, ali e acolá, o império onde o sol jamais se põe é extenso, intenso e diverso.
Circulam boatos que a bonitinha já fez de tudo, tudo mesmo, com o príncipe, o que foi saudado alegremente com fogos de artifícios em Buckingham, muitos membros da British Royal Family já caíram em armadilhas bem constrangedoras. Em termos de baixaria Sarah Ferguson e os príncipes Andrew e Charlie (replicado farsescamente no plebeu homônimo Sheen) nunca foram exceções. Basta ler algumas biografias de alguns dos artistas nascidos naquelas bloody islands para entender que os pervertidos, depois que abandonam o jugo familiar, entram em fase de delírio, a vida estudantil é uma selva, ninguém perdoa ninguém, loucura pouca é desperdício de talento, e, em nome das descobertas intimas, "todos toleram uma sodomiazinha amigável entre colegas, de vez em quando" (como escreveu Jonathan Coe, talvez com conhecimento de causa).
Como a modernidade é um dos sinônimos da civilização anglo−saxônica, cabe, educadamente, omitir que James William Middleton, irmão de Kate, 21 anos, acrescentou pequena glória ao histórico palaciano quando foi surpreendido experimentando roupas femininas. Comentários, diante do armário aberto, concordaram que o modelito teve caimento perfeito no corpitcho do mancebo.
Any way, como costumam dizer lá em Álbion, se valerem algumas histórias sobre o quanto as famílias dos noivos são esquisitas, não há porque estranhar que, quando Kate conheceu William (não confundir com o músico, músico?, Will.I.Am), o rapaz era, digamos, um analfabeto sexual, ela provavelmente precisou utilizar de toda a pedagogia possível com o príncipe, ensinar o basicão do enjoy the sex, a mão naquilo, aquilo na mão e aquilo naquilo. De várias maneiras, formas e sabores. Como prêmio para tanto esforço agora tem o prazer de usar o anel que foi propriedade da sacrificada sogra. As delícias de cama, mesa e banho são formas contemporâneas de escravidão.
Na outra ponta da corda, aquela senhora com ares de cão de caça, que adorna sua augusta fronte e seu glorioso colo com alguns quilos de pedras preciosas roubadas das colônias, munida da ameaça de não nomear William como o seu sucessor, deve contribuir para silenciar alguns arrebatamentos e escarcéus. Mostrando que também sabe tirar coelho de cartola, digo, do chapéu retrô e kitsch que costuma usar em solenidades políticas e sociais, Sua Majestade Real, a Rainha, espera que o matrimônio do príncipe garanta algum fôlego para a monarquia, urge calar as ingratas vozes republicanas, essas mesmas que recusam compreender o esforço patriótico da família real nos campos de golfe, nas caçadas à raposa ou nas festas regadas a champagne e caviar.
Para que isso aconteça, o casamento real, além da consagração de uma história de amor, também implica na imposição de one role model. Guilherme, perdão, William, como se não bastasse ter que agüentar as maluquices do irmão (que talvez compareça ao enlace vestindo o uniforme da Wehrmacht), do pai, dos tios e das tias, e de vários primos e primas, ainda precisa preservar o nome familiar. E isso ele tem procurado fazer, seguindo o padrão de normalidade de um cachorrinho bem adestrado, que nunca mostrou rebeldia em público, que nunca infligiu regras (diferente de Harry, aquele que nunca será Potter).
William, conforme o que determina o estatuto do charming Prince, sempre foi um bom−moço. Mesmo quando, usando kilt, mostra as pernocas. O que, óbvio, não impede surpresas. Se o príncipe tiver os genes dominantes da mãe, sempre haverá a possibilidade de, uns dois ou três meses depois do conúbio, as manchetes dos jornais absolutamente isentos de intenções malévolas (The Mirror ou The Sun, por exemplo) estamparem o principesco desejo (absolutamente compreensível em qualquer homem) da transmutação erótica: ser o tampax real ou, sei lá, o absorvente da moda, o passear consensual e impune pelos aposentos privados do castelo.
No entanto, a pompa e circunstância que emolduram o casamento, the honey moon e outros néctares, devem impedir, por enquanto, que se tornem públicas essas provas de amor. Seguindo as normas sociais que regem a casa de Windsor (conhecida em outros carnavais como Saxe−Coburgo−Gota), alguns sacrifícios precisaram ser efetuados. Principalmente depois que o patinho feio preferiu pagar ingresso no parque de diversões da Duquesa da Cornualha.
O quadro se mostra simples: o jovem e tenro William é a vítima da vez. Só o tempo dirá se essa aposta de Elizabeth é racional ou fruto da esclerose.
A encenação matrimonial vai ocorrer em Westminster Abbey, local mágico para esse tipo de espetáculo, o povo ficará encantado, e, mais uma vez, perderá a oportunidade de separar o real e o imaginário. Para ajudar na mi(s)tificação, o Youtube vai transmitir o evento ao vivo e em cores, possibilitando para aqueles que, ordeiramente, acenarão para a carruagem real, o acesso virtual a imagens que, daqui a alguns anos, quando esse casamento (assim como aconteceu com o consórcio afetivo da mãe de William) estiver esfarelado, serão o equivalente ao velho retrato de família pendurado na parede.
Noves fora zero, com essa troca de alianças em público, o príncipe talvez esteja sonhando em legalizar o complexo de Édipo: dormir ao lado de uma nova "princesa do povo", com o direito adicional do espocar frenético dos flashes dos paparazzi. Nenhum problema, muita gente considerada mentalmente sã também compartilha da esperança de substituir o pai no tálamo conjugal.
Como os contos de fadas nunca devem ser desprezados, apesar do salutar schadenfreud (a nos lembrar que tropeções alheios são as nossas alegrias mais sinceras), cabe, no pub mais próximo, pedir a shot of spirit or a half pint of lager (quiçá Royal Virility, que é uma potente mistura de cerveja e viagra) e brindar ao lovely wedding.
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