Entre as inúmeras bobagens que cometi pela vida afora, houve um tempo em que tentei colaborar com o teatro. Não como ator, é claro. Faltava−me talento e cara−de−pau. Foi lá pelos anos 80 do século passado. Mestre Leoncir Cardoso Borba me disse que estava precisando de um assistente de direção. Em outras palavras, de um "office−boy". Munido de uma paciência estóica – que nunca imaginei ter −, aceitei o convite. Como prêmio para essa insensatez quase quebrei o nariz. Cheio de boas intenções, atropelei uma escada, lá no palco do antigo Colégio Diocesano. Creio que foi durante a montagem de "Deus lhe Pague" (Juraci Camargo), clássico que nenhum grupo amador comprometido com a "causa" artística pode deixar de encenar. Antes já havíamos tentado destruir "O Auto da Compadecida" (Ariano Suassuna). Quase conseguimos. Ainda hoje tento descobrir onde foi que erramos.
Um dia, ao perceber que não possuía os músculos necessários para o "papel" de carregador de cenários, o que comprova o quanto o pessoal da técnica sofre, resolvi me transferir para as fileiras da crítica. Quer dizer, crítica teatral de verdade a aldeia nunca teve. Nem mesmo nos dias atuais. Mas... vá lá, era a oportunidade de continuar "teatralizando", sempre havia um monte de festas, e a socialização (em diversos níveis) era constante e interessante.
Além disso, iria assistir a todos os espetáculos (de graça) e, mais importante, seria pago para escrever sobre eles. Ledo e airoso engano! Logo na primeira semana, durante uma das apresentações que integravam o FETEL (Festival Estudantil de Teatro de Lages), perdi a paciência com uma montagem ruim e... "sentei a lenha"! Munido da "otoridade" do cargo, despachei o espetáculo para o cesto de lixo mais próximo. E da maneira mais cruel possível. Resultado: fui despedido. Alguém pediu a minha cabeça e o jornal atendeu a solicitação.
No ano seguinte, prometi me comportar. Ao fazer a cobertura do evento para outro jornal, caridosamente poupei vários erros absurdos. Mas não houve jeito: na primeira oportunidade, descarreguei a metralhadora. Entre mortos e feridos, cabe destacar a forma carinhosa com que um moço educadíssimo me ergueu pelo colarinho uns bons dez centímetros do chão. Parece que não compartilhávamos da mesma opinião. Felizmente, antes que o Hulk promovesse algum estrago no meu rosto, a turma do "deixa−disso" interveio e no melhor estilo "cavalaria americana" evitou o escalpo. Ufa!
Depois dessas aventuras, aceitei ser jurado do FETEL. Duas vezes! 1983 e 1985. Foi doloroso. Para aqueles que dividiram a função comigo. Nunca, repito: nunca, compartilhei da opinião da maioria. Sempre votava nos espetáculos que me pareciam estar "alinhados" com uma "postura política de transformação social". Naqueles tempos a mosca azul do comunismo juvenil estava com a corda toda. É possível que o Padre José Antônio (uma figura fantasticamente gentil), lá pelos idos de 1985, tenha pensado (durante um desses debates idiotas em que a gente se mete sem saber porquê ou para quê) em pedir minha excomunhão – tamanha bagunça aprontei.
Em 1985, por culpa do Nelson "Furmiga" Andrade, fui convocado para "contribuir" com o teatro catarinense. Ele havia proposto o meu nome como jurado do II FECATE (Festival Catarinense de Teatro), que se realizou em Florianópolis. Não lembro o motivo que me fez aceitar essa tarefa, embora tenha certeza que não foi competência. Fiquei uma semana hospedado em excelente hotel, comendo e bebendo do bom e do melhor. O único (único?) inconveniente era assistir quatro peças por dia. Alguns dias, cinco. Em algumas, dormi. Em outras, abandonei. Bastavam as luzes apagarem e, da maneira mais irresponsável possível, dava um jeito de sair. Só voltava para o encerramento ou para o debate (nos casos em que eu era o mediador). Mesmo assim, foi divertido. Conheci varias pessoas muito mais malucas do que eu, bebi caminhões de cerveja, e aprendi umas duas ou três coisas que me ajudaram a entender um pouco melhor a vida.
Com o passar do tempo, apesar do estímulo de atores como Lota Lothar Cruz (que fez do teatro uma lição de fé e esperança), concluí que o mundo e as artes cínicas, digo, cênicas, poderiam sobreviver sem as minhas confusões. Estava na hora de atormentar outras pessoas, em outros lugares.
Gostei deste depoimento Raul. è isso ai! Ficou legal. Um abraço.
ResponderExcluirObrigado!
ResponderExcluirRaul,
ResponderExcluirPor onde anda o Lota Lothar Cruz? -Não vejo este grande amigo desde a década de 70 quando tentamos cometer o Auto da Compadecida no Colégio Diocesano. Já o festival de música que parou o período noturno, este rolou. Bons tempos...
Ike: Nosso dileto amigo Lota Lothar continua alegre e faceiro. Trabalha no SESC.
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