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sexta-feira, 23 de setembro de 2011

PRIMAVERA


Começou a primavera. Bem−vinda. O ano passou rápido. Três trimestres foram embora. Velozes como um cometa. Um daqueles bem luminosos, alegria de astrônomos e astrólogos, impressionante em sua grandeza, trinta segundos de beleza plástica transformada em espetáculo.

O inverno ficou para trás. Felizmente. Escapamos de um ano terrível. Frio e chuva. Muita chuva, muito frio. A velha coberta de guerra, feita com pena de ganso, fez parte da vida durante mais de três meses. Como alguns são mais felizes do que os felizes, quem dispôs de "cobertor de orelha" sobreviveu melhor a esse inferno que nos retira o calor.

Setembro está terminando. Seus últimos dias − plúmbeos e feios – serão substituídos pela luz do sol e pelo pulsar cromático das folhas e das flores. O guarda−chuva (o mais infiel dos animais domésticos, como gostava de dizer Mário Quintana) deve ser jogado dentro de algum armário. Assim como as diversas camadas de roupas. Vestindo camisetas, bermudas, calças leves e folgadas, é hora de viver a vida no que ela tem de melhor.

Depois, o verão. Depois. Agora é tempo de primavera. O equinócio (do latim aequinoctium) nos garante que a duração dos dias e das noites será igual, nos garante que nada mais será igual. Agora é tempo de descobrir as sensações e as belezas que o inverno escondeu. Agora é hora de encontrar os amigos, jogar conversa fora, contar piadas politicamente incorretas, jogar futebol, namorar, beber suco no meio da tarde, jogar sinuca, ouvir jazz, tomar sorvete, saborear comidas exóticas. Com o inicio da primavera está liberada a temporada de churrascos e cervejas. Agora é tempo de traçar planos mirabolantes sobre as melhores formas de invadir e conquistar o litoral.

Na primavera é possível acreditar na felicidade. O renovar da paisagem renova os sentimentos. As pessoas ficam mais bonitas, mais alegres. O prazer de viver embriaga. A temperatura aumenta – o sangue também fica quente. As trocas de olhares são mais intensas. Olho no olho e a confusão está formada. Doce confusão. Daquelas que ninguém quer fugir. É a libido dando as cartas e as caras. É a primavera (ou alguma outra prima: Solange, Tatiana, Helena, Alessandra...).

Na primavera não há lugar para o pecado. É tempo de sair de casa, encontrar o sol, adquirir uma nova cor de pele, demarcar os contornos geográficos do espaço lúdico, revelar as tentações do desejo. É hora de trocar de paixões. É o momento de telefonar ao mundo e anunciar que o inverno terminou.

Basta de ficar em casa, vendo o musgo crescer e as teias de aranha se formarem no teto. As folhas que começam a brotar nas árvores nos convidam para um longo passeio pelas ruas da cidade. No horizonte surgem vontades de singrar as praças, os sonhos e os encantos. Convites e promessas. Com um pequeno empurrão da sorte, o que é bom nos abraçará – suave e gostoso como um beijo.

O inverno acabou.

9 comentários:

  1. Aqui é outono, tempo nostalgico, ventos ainda mornos, pingos de chuva. Mesmo assim adorei ler o seu texto colorido, fortificante, com aroma de primavera.

    Um abraço
    oa.s

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  2. E a primavera me trouxe o riso horrível do idiota.
    Rimbaud.

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  3. OceanoAzul. Sonhos:

    Obrigado! E lamento não poder repartir a primavera contigo!

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  4. Primavera é isso aí mesmo, o renascer de esperanças. Muito perfume e muita cor. Será que pode haver alguém que não goste?
    Lindo texto.

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  5. " Se todas as coisas boas durassem para sempre, você saberia como são importantes? "
    Toda essa magia...do pulsar da natureza, alternando ciclos...eu, com certeza,
    saberia, que a Primavera sempre chegaria!!!
    Lindo texto, Raul!

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  6. Obrigado, amigo. Texto tão bom quanto a primavera.

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  7. Obrigado a todos os que comentaram essa postagem!

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  8. Depois, o verão!
    Magnifico Dr. Raul, grande abraço.

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