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terça-feira, 10 de abril de 2012

CLIFFORD “CLIFF” JANEWAY

Livros e crimes violentos. Com essa proposta o estadunidense John Dunning escreveu uma série de romances. Literatura de entretenimento. Primeira classe. O protagonista, Clifford Janeway, Cliff para os amigos, se desdobra em dupla jornada de trabalho: desvendar mistérios relacionados com bibliofilia e administrar a livraria Twice Told Books, em Denver (Colorado). Essa situação é conseqüência de um momento de insanidade. Coisa pouca se levarmos em consideração a longa tradição de machos-alfa (Philip Marlowe, Sam Spade acenando da primeira fila) que povoam a literatura que mistura ação, mistério e aquelas histórias que alegram as páginas mais sangrentas dos piores jornais.

Cliff Janeway é definido por uma das personagens femininas de Edições Perigosas de uma maneira pouco simpática: Você traz a violência debaixo do braço. Ela o acompanha aonde quer que vá. Você a carrega como outros homens carregam valises. Definitivamente, esse não é o melhor cartão de visitas que poderia ser apresentado a alguma moçoila indefesa ou “femme fatale” com quem ele poderia protagonizar travessuras de cama, mesa e banho.

Depois que pediu demissão da polícia, Janeway preferiu ganhar a vida ou gastar o tempo comprando e vendendo livros antigos – edições raras, fora do mercado, somente acessíveis para uma meia dúzia de afortunados (em vários sentidos). Ou seja, pelo pior motivo possível se tornou um especialista na arte de negociar um tipo muito especial de brinquedo para adultos com alto quociente de inteligência e auto-estima beirando o rodapé.

Infelizmente, por mais doce que seja essa atividade, onde o conhecimento e a paixão se misturam com a insensatez, Tudo se [resume] em dinheiro. (...) Precisaria de outras coisas – conhecimento, gosto, olho clínico, intuição, sangue de jogador, imaginação de prostituta. Mas, sem dinheiro, não se pode nem começar.

Essa lição, Janeway não precisou de muito tempo para aprender. Quase imediatamente descobriu que por trás de um bom lote de livros raros sempre existe uma história sórdida. O enredo de Edições Perigosas confirma esse palpite. Um dono de livraria ambicioso, alguns alfarrabistas (comerciante de livros no varejo) e um colecionador que talvez desconhecesse que guardava uma pequena fortuna em livros raros – são esses os ingredientes básicos (e suficientes) para equilibrar um texto dinâmico, repleto de diálogos e cenas sangrentas. Nenhum leitor que aprendeu a se divertir com a cartilha escrita por Raymond Chandler e Dashiel Hammet pode exigir mais do que isso.

O desfecho do mistério ocorre depois que as pistas, quase imperceptíveis, vão sendo espalhadas ao longo das páginas que compõem a planície narrativa. O jogo de esconde-esconde não apresenta muitas dificuldades. Leitores mais treinados nesse tipo de charadas chegam a solução do enigma antes do terceiro quarto do livro. Não tem importância. Dunning não escreve para competir com aqueles que adquirem seus livros. Quer divertir. E para isso competência não lhe falta. Tanto que, depois da última página, não é possível impedir a vontade de “quero mais”.

Todas as histórias protagonizadas por Cliff Janeway são narradas em primeira pessoa, uma forma explicita de revelar que o personagem que trabalha com livros também os escreve. E o faz de tal forma que a atividade literária se mostra complementar em todos os aspectos do saber.

Em outros livros da série, em lugar de ficar atrás do balcão, esperando que surja do nada algum cliente disposto a gastar pequena fortuna com os livros expostos na vitrina, Cliff Janeway revela incrível disposição para se envolver em confusão. Em Impressões e Provas, A Promessa do Livreiro, Assinaturas e Assassinatos, O Último Caso da Colecionadora de Livros, seja ao contar a história da procura por um exemplar raríssimo de O Corvo (Edgar Allan Poe) ou recuperar um lote de livros roubados a muito tempo, seja em histórias relacionadas com livros autografados ou coleção de livros infantis, o prazer do leitor está garantido.

Sem se preocupar em economizar hematomas e conquistas amorosas, Janeway, por mais que goste de livros, nunca se libertará da pesada carga que o destino colocou em suas costas: resolver crimes.

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