As ameaças de expansão espanhola (castelhana)
no sul do Brasil causavam calafrios em Luiz António de Souza Botelho e Mourão, Morgado
de Matheus, governador de São Paulo entre 1765 e 1775. Para tentar impedir
esses avanços, ordenou que António Correa Pinto de Macedo organizasse uma
expedição e, quando fosse possível, fundasse um povoado em terras primitivas.
Isso aconteceu em 22 de novembro de 1776, depois de alguns imprevistos. A vila de
Nossa Senhora dos Prazeres dos Certões e dos Campos das Lagens, 916 metros do
nível do mar, situada no atual Planalto de Santa Catarina, serviu ao propósito
primeiro, mas também contribuiu para a extinção de várias tribos indígenas (Kaigangs
e Xoklengs).
Com o passar do tempo, o vilarejo sofreu
várias alterações. Com o transito intenso
de viajantes, comerciantes de gado e muares, surgiu um entreposto comercial. As
famílias dos fundadores, pela primeira vez, se misturam com pessoas sem o
mínimo interesse no desenvolvimento da região.
Nos períodos do Império e da República,
novas mudanças: o Planalto se transformou em terra de coronéis políticos e de
fazendeiros indolentes. O voto de cabresto se tornou prática corrente – os opositores
eram eliminados rapidamente (subornos, agressões físicas e psicológicas).
A prosperidade financeira aconteceu entre
os anos 40 e 60 do século passado, com o apogeu do ciclo da madeira. Imensos
pinheirais foram derrubados e transformados em dinheiro. Essas fortunas (descontada
a parte que foi gasta com cavalos lerdos e mulheres ligeiras) serviram para
comprar imóveis no litoral, Florianópolis e Itapema.
A fuga de capital pode ser vista como metáfora
do extrativismo selvagem. E que está de acordo com o pensamento das classes
dominantes – que adoram negar as origens coloniais. A isso se acresce outro
item: a xenofobia. O trabalho pesado das serrarias foi executado por
descendentes de italianos, vindos do norte do Rio Grande do Sul. A invasão dos gringos assustou as famílias tradicionais, que preferiram imigrar a se misturar com
gente grossa e mal educada. Resultado: a população original desapareceu na
poeira do tempo. Foram tragados pelo descaso ou pelo orgulho.
Esse resumo historiográfico serve de
moldura para dizer/escrever uma pequena bobagem. Está frio, mais ou menos uns 15º
C. Essa mudança climática é uma forma de reconhecer a cidade em que nasci. Vou
tirar as cobertas do armário. Será uma noite fria e quente (nosso paradoxo de Schrödinger
particular).
Pela janela do escritório, vejo o céu
acinzentado, as nuvens carregadas – anunciando chuva. O meteorologista, na
televisão, concordou com esse diagnóstico. Nas próximas horas será ainda mais
gelado. Digo isso como se estivesse recebendo uma dádiva. Aqueço as mãos na xícara de chá.
Amanhã, vou sentir prazer em ficar em
casa. Vou ver a chuva escorrer pela avenida. Provavelmente lerei algum
romance policial ou de ficção científica. Deitado no sofá, enrolado em cobertor, deixarei a tarde se
esvair, suavemente.
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