Deixei a janela do escritório aberta durante boa parte do dia. No final da tarde, ao fechá-la, descobri que não estava sozinho. Tinha uma joaninha grudada na cortina. Não tenho conhecimentos entomológicos para definir a taxonomia da minha visitante. Segundo os especialistas, há seis mil espécies, distribuídas em 350 gêneros, distinguíveis por padrões de cores e pintas, além de diversas características. E, sejamos objetivos, esse costume de querer conhecer a genealogia daqueles que frequentam a nossa casa está ultrapassado.
A presença do coleóptero exigia alguma atitude. Em um primeiro momento, imaginei que poderia fazer as honras da casa e convidar a visita para o chá (e uns biscoitos amanteigados). Mas, logo depois de consultar a Wikipédia, descobri que esses animais se alimentam basicamente de ovos e larvas de outros insetos – e isso eu não tinha para oferecer. Concluí que colocá-lo de volta na natureza provavelmente seria o mais apropriado. Isso precisaria ser feito com tato e discrição. A minha intenção nunca foi a de parecer rude ou mal-educado. A senhora minha mãe jamais me perdoaria se eu demonstrasse comportamento agressivo com quem estava tentando se hospedar no apartamento em que moro.
Antes de resolver o impasse, pensei em fotografar a joaninha, talvez uma selfie de recordação para a posteridade. Talvez uma possível postagem no Instagram ou no Facebook. Foi um pensamento insensato e que se esvaiu rapidamente. Não existe motivo razoável para tornar pública a intimidade do animal – além disso, sempre há o risco de algum processo judicial por exposição indevida, dano moral ou algo similar. Desisti do intento.
Poderia perguntar à joaninha se ela queria algum tipo de ajuda para ir embora. Poderia. Antes que tivesse a chance de fazer o questionamento, percebi que o problema era grave. Não havia a possibilidade de, digamos, abrir as asas e voar para longe. Alguma coisa estava prendendo-a na cortina. Com a ajuda de uma folha de papel, tentei libertá-la. Consegui.
Infelizmente, caiu atrás do sofá. Ninguém me condenaria se tivesse pronunciado um palavrão, efeito sonoro adequado à ocasião. Controlei o temperamento, arrastei o sofá e fui procurar por aquele ser minúsculo. O besouro não era maior do que um centímetro. E estava imóvel no chão. De forma apressada, pensei que teria que levá-lo ao hospital veterinário, talvez tivesse quebrado uma perninha ou deslocado uma asa, não imagino que tipo de traumatismo uma queda de menos de um metro pode causar nesse tipo de animal. Felizmente, não era nada grave (imagino). Ele se moveu na direção da parede.
Consegui colocá-lo em cima da folha de papel e o levei-o até a janela. Depositei aquele corpo frágil (para o meus padrões) no parapeito. Fechei a janela e as cortinas e fui tomar banho. Hoje pela manhã, quando acordei, não havia mais sinal de sua presença. Pode ter sido levado pelo vento ou então se reunido com outras joaninhas, essa é uma região propícia para que as Coccinelidaee construam moradia.
Sei lá, pode parecer ingenuidade, mas foi bom ver que a vida continua pulsando ao meu redor. E que, por isso, eu também precisei me movimentar.
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