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segunda-feira, 6 de abril de 2020

DIÁRIO DA QUARENTENA (XV)




A cultura e o esporte são duas áreas que foram atingidas gravemente pelo Covid-19. Os negócios que movimentam essas duas indústrias atingem valores estratosféricos e, de uma forma ou de outra, são uma fração importante da economia. Os efeitos secundários dessa gangorra financeira (teatros, cinemas, estádios, exposições, hotéis, restaurantes, transporte, turismo, materiais esportivos, etc.) também são significativos.

Como será possível recuperar as peças de teatro que foram canceladas, os recitais de música que precisaram ser interrompidos, os lançamentos de livros adiados, os filmes que não foram rodados? E os artistas de rua, que vivem um dia por vez, quem vai se preocupar com eles? Inúmeras manifestações artísticas encontraram um nicho na internet: leituras de poesia e prosa, lançamentos virtuais de livros, promoções das livrarias, cursos de curta duração, shows de música. Esforços para amenizar a crise. Tudo muito bom, tudo muito bem, mas quase nada disso resulta em algum ganho econômico. Sem dinheiro, não há sustento; sem sustento, não há vida; sem vida, não há arte.

O ballet do tenista canadense Denis Shapovalov

Quem poderá trazer de volta os treinos preparatórios daqueles atletas que iriam competir na Olimpíada de Tóquio? Se o evento se realizar no próximo ano, quantos atletas de alto rendimento ainda estarão no ápice de suas performances? É possível que uma geração esportiva esteja se perdendo neste instante. Campeonatos de futebol, basquete, vôlei e muitos outros esportes foram suspensos ou cancelados. Até o Torneio dos Candidatos (xadrez), que estava sendo realizado em Yekaterinburg (Rússia), foi interrompido. O tenista Bruno Soares, em entrevista ao jornal La Nación, diz ser impossível visualizar um cenário de normalidade no curto prazo e que a temporada está quase perdida.

Uma situação de tranquilidade está cada vez mais distante. Artistas e atletas ainda em formação também estão com o futuro comprometido. Será que há sentido em treinar todos os dias para um prova esportiva que nunca se realizará? Será que as artes plásticas, a música e a literatura serão capazes de encontrar algum sentido nessa crise? Vladimir e Estragon continuam esperando por Godot – que talvez chegue amanhã.

A cultura sobreviverá; o esporte, não. Não se trata de uma expectativa, mas de uma análise baseada em evidências. Quem trabalha nessas áreas já percebeu que os desafios se multiplicam a cada instante.



Reduzida aos fragmentos, multiplicando as ações individualizadas, utilizando algumas das ferramentas da modernidade, a cultura manterá a chama viva. A produção de espetáculos por demanda virtual (com streaming) talvez seja uma saída – mas não para todos. O esporte (individual ou por equipes), ao contrário, necessita da presença do público – além de uma grande rede de apoio. Os riscos de contágio são imensos e não devem compensar os ganhos financeiros. Outro diferencial são os patrocínios – atividade comum nos eventos esportivos. Quem terá interesse em investir em competições que possivelmente serão relegadas ao segundo plano? O futebol montou uma rede de sustentação televisiva, mas não se pode dizer o mesmo do basquete (exceto nos Estados Unidos), do vôlei, do handebol, do atletismo. Estarão essas modalidades destinadas à extinção?

O mundo está de ponta-cabeça. Artistas e atletas estão em perigo. O Covid-19 é a peste negra da modernidade.    


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