Quando a quarentena acabar e o mundo
voltar ao “normal”, vou ter dificuldades para me adaptar. É que estou ficando
viciado em lives literárias. Assisto, todos os dias, uma ou duas. Normalmente
as vejo no Facebook, no Instagram e no YouTube.
A vantagem é que todas as tendências,
estilos e gêneros literários são contemplados por essa nova maneira de
comunicação direta com o público. Não sei se isso é bom ou ruim, mas acena para
uma forma de jornalismo cultural que dispensa a intermediação das plataformas
formais. Essa ação difusa (algumas vezes, confusa) traz à tona algumas vozes
que são silenciadas no dia a dia (negros, índios, mulheres, LGBTQ+, etc.).
Meu interesse têm se mantido restrito em
alguns dos grandes temas (literatura, música, história, ações culturais,
economia e política). Esporadicamente, outras disciplinas entram nesse balaio
de gatos. Não é possível evitar que a razão seja contaminada por outras narrativas, por outros
discursos.
As lives das editoras de renome optam por apresentar
bom comportamento, tudo sem graça. Provavelmente combinam o roteiro
antecipadamente. Só falta aparecer um editor de imagem no meio da conversa para
lembrar que os participantes devem fazer merchandising de 15 em 15 minutos,
tempo é dinheiro, precisamos faturar. Quando terminam, a impressão que deixam é
a de uma salada de chuchu – ricas em fibras, mas insipidas.
As melhores são aquelas em que predomina
o (bom) humor, o deboche e a anarquia. Nesse particular aspecto, os bate-papos
organizados pelo pessoal do Carnavalhada são excelentes. Assisti alguns em que
a intermediação foi realizada pelo Marcelo Labes. Total improviso e fantástica
empatia entre os convidados e o mediador.
A editora Reformatório (leia-se Marcelo
Nocelli) apostou em uma alternativa comercial e cultural. O lançamento virtual de Velhos, contos da Alê Motta (supersimpática!) foi surpreendente. Fiquei interessado no livro.
O colóquio entre Rafael Araldi Vaz e
Rodrigo Diaz de Vivar y Soler, dois estudiosos de Michel Foucault e Giorgio
Agamben, abordou questões fundamentais da necropolítica em vigência nestes
tempos sombrios de Covid-19.
O pessoal da página Trocadilhos de
Quinta, do Facebook, Leo Cunha e Henrique Rodrigues, guiados pelo André
Ricardo, mergulharam na poesia da prosa que não poupa trocadilhos, troca de
ilhas, mares nunca antes navegados pelo humor. Foi divertido.
No campo das minorias, a editora Malê
está se notabilizando por reunir alguns nomes importantes da literatura
afro-brasileira: Tom Farias, Elisa Lucinda, Ryane Leão, Simone Ricco, Fernanda Miranda.
Com mediação de Wagner Amaro (autor de Eles), a turma não tem poupado
críticas contra um sistema que privilegia o homem branco, classe média,
heterossexual e fascista.
No último sábado (18/04), entrei na
metade de um diálogo entre Ana Zeppa (que eu não conhecia) e Marcelino Freire.
Foi uma maravilhosa surpresa. Aula de teoria literária de alto nível. Uma hora
depois, na página do Centro Cultural Barco (Facebook), Marcelino conversou com
Marcelo Rubens Paiva. Ganhei o dia.
Outros escritores que tive oportunidade
de ver: Victor Bonini, Camila Assad, Gustavo Matte, Marcelo Ariel, José Inácio
Vieira de Melo, Alexandre Vidal Porto, Luisa Geisler, Natália Borges Polesso,
Samir Machado de Machado, Marcelo Ferroni,... são tantos, devo ter esquecido
alguém.
Várias editoras e organizações estão promovendo a divulgação de livros e autores: Aleph, Companhia das Letras, Reformatório, Rocco, Record, Malê, Harper Collins, Micronotas, Câmara Brasileira do Livro,
etc. Basta acessar as páginas e ver as programações. E, se houver interesse,
comprar os livros.
Para quem gosta de estar informado sobre
a literatura brasileira contemporânea (meu caso), as lives são momentos de integração e
prazer. Na tela do computador ou do smartphone, a literatura se mostra
viva.
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