Gostaria de saber se as pesquisas sobre o
sistema homeschooling mudaram durante a quarentena. Uma das vantagens dos
tempos de crise está em colocar em evidências as diferenças mais elementares entre
a teoria e a prática. Defender o ensino escolar no âmbito familiar é uma
posição teórica interessante. Conviver com uma, duas ou três crianças hiperativas
em espaço reduzido não parece ser tão atraente. Principalmente para aquele
segmento da classe média que não abre mão do trabalho e opta por deixar os
filhos sob a supervisão da empregada, da creche ou da escola.
Deve ser interessante ver mães e pais tendo
que conciliar o home work com o horário de dar banho nos filhos, fazer as
refeições, ajudar nas tarefas escolares e brincar. Esse último item talvez não
seja um grande problema: basta liberar um tablet repleto de joguinhos – cena bastante
comum em restaurantes, onde o uso do brinquedo está intimamente ligado ao
comportamento passivo da criança.
Em lugar de valorizar os professores,
alguns pais preferem gastar (a médio e longo prazo) pequenas fortunas com
psicólogos e antidepressivos. É uma escolha. Provavelmente, equivocada. O anti-intelectualismo
jamais produziu progresso ou uma economia em desenvolvimento.
Um sinal de que a situação está se
tornando horrível no campo educacional pode ser comprovado no fato que utilizei
nos parágrafos acima três expressões em inglês: homeschooling, home work e tablet como se fossem elementos naturais do discurso. Não são. Ao contrário,
constituem evidências de que a língua portuguesa está sendo contaminada pelo
anglicismo de origem estadunidense. E, por enquanto, não há uma vacina contra
esse vírus.
Não se trata de evocar o espírito de
Policarpo Quaresma, adorável personagem de Lima Barreto. Tampouco se quer ressuscitar
o projeto do Deputado Aldo Rebelo que propunha, ingenuamente, impedir o uso de
estrangeirismos nos locais de trabalho e na maioria das formas de comunicação.
A questão é outra.
O português é uma língua viva, permeável,
e em constante transformação. Os acréscimos são bem-vindos. Não importa se a
origem dos novos vocábulos está localizada nas gírias ou nos estrangeirismos. O
uso determina a existência e o reconhecimento. Por isso, e outras questões, cabe
atenção em três itens: a adoção de palavras que possuem equivalente
dicionarizado em português, a linguagem técnica e o internetês.
O verbo deletar, por exemplo, é uma
anomalia incompreensível. Porque alguém prefere usá-lo em lugar de apagar, eliminar,
suprimir, extinguir, banir, cancelar ou tirar? São tantas as palavras
equivalentes que o uso de mais uma não possui sustentação lógica. Palavras que
podem ser expressa no vocabulário dicionarizado não deveriam ser substituídas
por estrangeirismos. Infelizmente, o português não está imune ao vaivém do
mundo da moda e das tendências ditadas pelas coleções outono-inverno.
Historicamente, a linguagem técnica está
restrita ao ambiente de trabalho. Esse procedimento implica no uso político da
terminologia como uma forma de dominação. Médicos e advogados são hábeis no
manejo dessas ferramentas. Contemporaneamente, com o processo de informatização
do cotidiano, parte desse vocabulário específico se expandiu “democraticamente”
por todos os lados. Há momentos em que parece que as pessoas estão falando um
dialeto do esperanto – e isso deixa sem esperança o futuro da humanidade.
Sobre o internetês pouco se pode dizer, exceto
que os bárbaros estão se aproximando dos portões da cidadela. Aqueles que
entendem que esse linguajar é uma forma coloquial de comunicação abrem caminho
para que tudo seja permitido e que o idioma se transforme em Torre de Babel.
Voltando ao início dessa conversa (tergiversar
é o meu maior prazer), o mundo restrito do ambiente doméstico não parece
adequado para ensinar as crianças. A linguagem utilizada pelos pais (e que está
contaminada pelo ambiente de trabalho ou por convicções políticas e religiosas)
muitas vezes entra em conflito com aquela que pode ser ministrada pela escola.
A pedagogia não deve ser substituída por achismos.
Por fim, para surpresa dos pais que
imaginam que o futuro dos filhos precisa projetar uma boa fonte econômica, ter
amigos – do ponto de vista psicológico – é mais importante do que acumular
conhecimento. E o grande catalizador das amizades é o mundo escolar.
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