Em tempos de isolamento social, talvez a
solução para os meus problemas econômicos esteja em escrever um livro de autoajuda.
Tenho pensado no assunto. Seria ótimo se se tornasse um besta-seller – principalmente
porque a gerente da minha conta bancária deixaria de me sugerir empréstimos.
Além da questão financeira (que é super-hiper-mega-ultra
importante), creio que o meu texto poderia (pode, poderá) ajudar aqueles que
estão com dificuldades para administrar a vida doméstica em tempos de pandemia,
ações criminosas do Estado e duas ausências cruciais para conservar a saúde
mental: novelas e futebol.
Sobre esse último item, que atinge dez
entre dez estrelas de cinema, digo, dez entre dez torcedores, a depressão está
se tornando um caso digno do divã do doutor Sigmundinho, aquele que explicou as
diferenças básicas entre as fases oral e anal na infância. Flamenguistas,
corintianos e gremistas (além dos demais aficionados) estão próximos do colapso
nervoso – uma saudade sem tamanho de ver os corpos suados, camisetas molhadas, o
ballet encenado no tapete verde do estádio e a catarse sexual do gol. A ausência
de testosterona, em síntese, está fazendo mal para esse grupo de machos-alfa.
A suspensão provisória das novelas resulta
em síndrome de abstinência. Algumas pessoas não conseguem viver sem uma ração diária
de alienação. Após o choque de realidade promovido pelos jornais televisivos, com
notícias sobre os avanços do vírus e as trapalhadas governamentais, nenhuma
alma seráfica se satisfaz com as reprises. As noites ficam mais longas e os
conflitos familiares que estavam adormecidos (aparentemente para todo o sempre)
saem do armário e, com a mesma voracidade dos zumbis, começam a atormentar a
vida domesticada. Nada é mais difícil do que conviver com aqueles que amamos.
O catatau que estou planejando (no
mínimo 500 páginas) terá esse perfil de personagem como público-alvo. Quer
dizer, outros também serão contemplados (só ainda não sei quais). O ideal é
atingir todas as faixas (sociais, etárias e alcoólicas) que estão em dificuldades,
mas usarei exemplos localizados, gente como a gente, porque (sempre pensando
nas vendas) é necessário mostrar empatia com os problemas alheios. Não terei
escrúpulos em imitar aqueles volumes que abarrotam as livrarias de aeroporto.
O livro será dividido em vários tópicos,
cada um com epígrafe bacaninha, escrita em algum idioma desconhecido
(aramaico, sânscrito, português). Erudição é tudo de bom!
Por enquanto, tenho três capítulos em
mente: resiliência, reinvenção e fôlego. Mais do que palavras-chaves, esses
conceitos estão relacionados com a mesmerização dos sentimentos, uma forma de convite
para que o leitor embarque no Titanic – primeira classe – que o levará para
Shangri-lá.
Está tudo conectado. Resiliência é uma
daquelas palavras que ninguém sabe qual é a exata serventia. Entre suportar ataques
físicos e segurar o choro no momento da desilusão amorosa, vale tudo. Somos
todos camaleônicos, por isso a reinvenção está na moda, instante mágico em que
o velho (fingindo que é novo) reaparece em uma embalagem bem bonitinha. Por fim,
ninguém quer ser acusado de ter pouco fôlego quando muitas pessoas estão tendo problemas
respiratórios.
Sem a canalhice, o sucesso fica mais difícil. Só me falta escrever o livro. Aguardem!
Sem a canalhice, o sucesso fica mais difícil. Só me falta escrever o livro. Aguardem!
EStamos com as mãos prontas para aplaudir, especialmente a epígrafe em sânscrito! Gosto de seu DIÁRIO DA QUARENTENA! Beijos
ResponderExcluirEstou torcendo por você!
ResponderExcluirAbraço!