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domingo, 28 de junho de 2020

DIÁRIO DA QUARENTENA (XCVIII)


Cafebreria El Pendulo, Cidade do México

O Covid-19 está matando as livrarias. Algumas editoras também estão com os dias contados. O modelo econômico, baseado no comércio eletrônico, vai – a médio e longo prazo – eliminar a diversidade e destruir a concorrência. Só sobrará (se sobrar) lugar para as grandes empresas – que podem oferecer descontos e promoções, atraindo o público que foi educado para levar vantagem em tudo.

Sim, eu sei que o parágrafo acima beira o niilismo e é contrário à (hilariante) filosofia do empreendedorismo. Mas, diga lá, nestes tempos de quarentena, como é que o pequeno negociante vai sobreviver com as portas fechadas, tendo que pagar aluguel, impostos e as despesas com água, luz, telefone, salários?

A crise atingiu um ponto nevrálgico: a distribuição. Os valores absurdos das tarifas postais estão inviabilizando as vendas de livros físicos, principalmente os usados (sebos). As empresas de transporte e entrega de mercadorias não conseguem ocupar o território abandonado pelos Correios. E os preços que praticam também não são competitivos.

Conglomerados como Estante Virtual, Portal dos Livreiros e Livronauta estão se arrastando para competir com a Amazon, Submarino e as cambaleantes livrarias Cultura e Saraiva – que não poupam esforços publicitários para ganhar clientes a todo instante. Mas, o inimigo principal do livreiro é outro: as plataformas que oferecem e-book (e seu primo pobre, o áudio-book) – basta acessar a loja virtual e fazer a compra. As vantagens são indiscutíveis: download instantâneo, não ocupa espaço de armazenamento e é mais barato. Ah, o e-read ajusta o tamanho de letra para aqueles que possuem problemas de visão.

Acumular livros físicos logo se transformará em excentricidade, algo como colecionar ossos de dinossauros, selos, moedas, pedras coloridas. A assepsia do prazer sensorial (peso, cheiro, tato), característica de um tempo em que as relações afetivas estão se tornado esgaçadas, acabará por produzir um mundo em que a mercadoria livro não terá personalidade (ou “aura”, na definição certeira de Walter Benjamin).

Não bastasse esse cenário desolador, a notícia recente da falência da matriz do Wirecard, o meio de pagamento usado pela Estante Virtual, jogou mais uma pá de cal em cima de quem está próximo dos últimos estágios de vida. Os sistemas de pagamento “on line” ficaram frágeis. A confiança está desaparecendo.  Além disso, a volatilidade da economia “real” (mas que se manifesta virtualmente) torna imprevisível qualquer plano de negócios que exija tempo de maturação. O imediatismo, atrelado às cotações do câmbio e da bolsa de valores, tende a destruir o futuro (se é que, nestes tempos tenebrosos, se pode falar em futuro).

As editoras estão adiando ou cancelando lançamentos. Para que colocar o produto à venda se não há compradores? Ou, em hipótese mais desoladora, se os eventuais clientes não conseguem acessar esse material? Tudo ficou mais difícil atualmente e os eventos pela Internet não possuem força suficiente para empurrar a área comercial dos livreiros.  

O que fazer? Ninguém sabe. Não há uma resposta para o desmoronamento. Comprar nas pequenas livrarias, sebos e editoras alternativas pode ajudar, mas não é garantido. É como dar um pouco de ar para quem acabará asfixiado. No entanto, enquanto for possível resistir... esse é o caminho que estou seguindo.      


Livraria Lello, Lisboa

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