Sujei a camiseta com chocolate e a Rede
Globo deixou de existir na minha televisão. Não sei que relação poderia existir
entre estes dois fatos. Se estivesse na Grécia, consultaria o Oráculo em
Delfos. No momento, isso é impossível. Estou residindo no interior de Santa
Catarina. E Madame Rosa, a mais celebre das pitonisas do vilarejo, partiu para a
outra dimensão faz alguns anos.
Órfão de quem poderia fornecer uma chave
de interpretação ou transformar tudo em alguns números (o jogo do bicho e a
quina se apresentam como opções lúdicas), só me restou jogar a camiseta no
cesto de roupa suja e esperar que alguma mágica aconteça e o canal volte a ser
sintonizado. Por enquanto, só consigo ver um aviso na tela: sem sinal.
Minha relação com as emissoras de televisão está se distanciando velozmente. Assisto aos noticiários nos canais abertos e, esporadicamente, algum filme no meio da madrugada – quando a insônia resolve aparecer. No resto do tempo, essa Esfinge a-pós-a-moderna-idade fica quietinha, lá no seu canto.
Nem sempre foi assim. No final dos anos
60, inicio dos anos 70, só era possível sintonizar um canal de televisão: a TV
Gaúcha, de Porto Alegre. Minha família costumava ir, no domingo à noite, jantar
na casa de um dos irmãos do meu pai (ficava perto). Depois da refeição, era
permitido assistir dois clássicos da época: o Show do Gordo e o Ringue Doze
Marinha Magazine. Os mais novos suportavam o programa de calouros porque logo
depois tinha as lutas de telecatch. Todo mundo torcendo pelo Ted Boy Marino.
Algum tempo depois, a TV Coligadas (Blumenau)
entrou no ar. Quando mudamos para a região do Aeroporto Velho, meu pai comprou
um televisor no crediário, incontáveis prestações. Foi esse aparelho que levei comigo
quando fui morar no sótão da casa de minha avó, logo depois da Grande Tragédia
Familiar, em 1972.
O episódio que causou maior confusão,
nessa época, foi a noite que passei em claro para assistir “Cidadão Kane” (Dir.
Orson Welles, 1941), filme que “todo mundo” considerava como obra de arte.
Baixei o som o máximo possível e fiquei próximo do televisor. Fui dormir lá
pelas quatro da madrugada. Minha avó, que tinha sono leve, ficou furiosa e, pela
manhã, ao me acordar para ir à escola, não economizou no sermão! Precisei rezar
uma dúzia de Ave Marias e Pai Nossos para tentar ser perdoado. O mais maluco disso
tudo é que não entendi o filme e nem aquela história do botão de rosa (rosebud).
Ah, dormi na aula.
Quando voltei a morar com minha mãe, a
televisão ficava ligada o dia todo e a novela das oito era o momento em que o
mundo parava para tomar a dose diária de anestésico romântico.
Depois, fui desapegando, a literatura e
o cinema se tornaram mais importantes. Preferi alugar filmes a assistir o lixo
comercial que se tornou regra geral nas televisões abertas.
Tentei a televisão a cabo duas vezes. Conclui
que não vale o dinheiro investido.
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