Em literatura, sou a soma de minhas
ausências. Tento corrigir isso, na medida do possível. Mas, em vários momentos,
a euforia é substituída por algum imprevisto. Na falta de imagem melhor, é como
estar correndo a maratona e – a dez metros da chegada – ser ultrapassado por
300 quenianos.
Olho para a pilha de livros que está no
criado-mudo e respiro fundo. Preciso ler, urgentemente, os últimos do Itamar
Vieira Júnior, Paulo Scott, Javier Arancibia Contreras, Julian Fuks, Miguel del
Castilho, Natalia Borges Polesso, Joca Reiners Terron, Reinaldo Moraes, Mirian
Alves. Isso para não falar nos romances de Lima Trindade, Rogério Menezes e Glauber
Soares, que comecei e não terminei. As biografias de Walter Benjamin, Lima
Barreto e Susan Sontag aguardam atenção e leitura.
Muitas pessoas reclamam (nas redes
sociais) que o clima da quarentena está atrapalhando o ritmo de leitura. Não é
o caso. Continuo firme e forte. Leio em todos os instantes possíveis. A
diferença é que resisto em ler o que deveria. Em lugar de um dos acima citados,
que estão alinhados com a minha formação intelectual e acadêmica, fui buscar na
estante romance de ficção cientifica que comprei a mais de seis meses e que
estava destinado a acumular pó por mais meio ano.
Provavelmente o meu inconsciente está procurando
o escapismo. Ou seja, uma forma de autoproteção contra um ambiente em que o
real é mais assustador que a ficção. O equilíbrio compensatório surge quando é
possível encontrar algo ainda mais absurdo que a realidade. Nesses termos,
talvez se enquadre o sucesso dos filmes adaptados de histórias em quadrinhos,
onde o espectador, diante de situações esdruxulas, ignora os princípios mais
elementares da lógica e aceita o cinema como uma válvula de escape para as
tensões cotidianas.
Esse tipo de raciocínio é
muita psicologia para pouco trauma. Leitores de romance histórico, policial,
espionagem, aventura ou fantasia não se preocupam em explicar porque gostam
deste ou daquele gênero. O mesmo acontece com quem mergulha na poesia e/ou se
interessa pela dramaturgia. O problema não está na preferência.
Almas bondosas talvez imaginem que a fluidez
da leitura está relacionada com o número de páginas. Então, recomendam contos e
crônicas. É uma ideia – mas só para algumas crônicas. Não todas. Por sua vez, o
conto está em outro patamar. É uma unidade ficcional complexa, repleto de
nuances e entrelinhas. O leitor precisa ter paciência e respeitar a tessitura
narrativa.
O que a pandemia atrapalhou foi outra
coisa. Estou com dificuldades para escrever. Tenho dois ensaios pela metade. Não
há como avançar na direção do desfecho. As ideias escaparam, fugiram, foram
passear em lugar incerto e não identificado. O máximo que consigo escrever são essas
500 palavras diárias – e isso porque impus para mim mesmo uma rotina espartana.
Sento diante do computador, todas as tardes, e digo para mim mesmo que é
necessário decifrar a Esfinge. Obviamente, relembro causos, aventuras e amigos,
elaboro discussões sobre o nada e roubo de mim mesmo ideias antigas. Em último
caso, mergulho no ficcional. Por enquanto, como dizem no Planalto Catarinense,
não é aquilo tudo, mas está dando para o gasto.
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